O Theatro Municipal de São Paulo
1. Panorama geral
O Theatro Municipal é uma casa de espetáculos administrada pela Secretaria de Cultura do município de São Paulo, inaugurada em 1911. Possui 1580 lugares, e tem programação cultural paga o ano todo, com programas que variam entre concertos, ballets, óperas e música de câmara, além de apresentações gratuitas variadas.
Ele é a “casa” de diversos grupos de música e dança da cidade; os chamados corpos estáveis do Theatro. São eles: a Orquestra Sinfônica Municipal, a Orquestra Experimental de Repertório, o Coral Lírico, o Coral Paulistano, o Balé da Cidade de São Paulo, o Quarteto de Cordas, a Escola Municipal de Música e a Escola Municipal de Bailado. Estes são, normalmente, os grupos artísticos que se apresentam no Theatro, no entanto, a casa recebe também grupos, companhias e montagens de outros teatros nacionais e internacionais. Da mesma forma, estas montagens podem ser apresentadas em outros teatros; é comum, por exemplo, a “troca” de montagens de óperas entre o Theatro Municipal de São Paulo e o Teatro Amazonas, de Manaus.
O Theatro também oferece uma visita monitorada, agendada e gratuita, divulgada no site da prefeitura da cidade, que acontece de terça a quinta-feira, às 13h, e aos sábados, às 9h30 e às 10h30. É guiada por um funcionário do Theatro, que percorre alguns ambientes do edifício por uma hora, com um grupo de até quarenta pessoas. Tal funcionário discorre sobre um texto básico – que pode ser visto no mesmo site onde se encontra o telefone para agendamento – com dados históricos sucintos e curiosidades sobre a construção.
2. História
A idéia de se construir um teatro imponente, dedicado principalmente a apresentações de ópera, surgiu na virada do século XIX para o XX, momento este em que declinava o Ciclo da Borracha e ascendia a produção de café no sudeste do Brasil. Essa ascensão significava o rápido enriquecimento dos chamados “barões do café”, que residiam principalmente em São Paulo. Por esse motivo, a cidade passava a figurar entre os maiores centros comerciais do país.
Essa aristocracia paulistana, que espelhava o seu estilo de vida no das sociedades de grandes centros europeus da época, como Milão, Londres e especialmente Paris, sonhava com uma São Paulo não somente capital econômica do país, mas também como uma capital cultural nos moldes de sofisticação e erudição europeus. Para tanto, era necessário que a cidade tivesse uma grande casa de ópera, que era a forma de entretenimento mais popular entre a elite.
A cidade, nessa época, contava com um único teatro de ópera, em que eram apresentadas suas principais manifestações artísticas: o Teatro São José. No entanto, ele não era considerado grande e sofisticado o bastante para os eventos culturais que a aristocracia queria ver serem apresentados em São Paulo: grande parte dos espetáculos encenados era arranjada e trazida pelos estudantes da faculdade de direito do Largo São Francisco. Em 1898, por conseqüência de um grande incêndio que destruiu toda sua estrutura, o Teatro São José encerrou definitivamente suas atividades.
A partir disso surgiu um movimento entre a elite paulistana, que pressionava a prefeitura para que fosse autorizada a construção de um novo teatro. Em 1903, após aprovação na Câmara dos Vereadores, a prefeitura de São Paulo desapropriou um terreno no Morro do Chá e acionou o escritório do arquiteto Ramos de Azevedo.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo era um importante engenheiro e arquiteto de São Paulo. Desde 1886 tinha seu próprio escritório, que já havia sido responsável por diversas edificações na cidade: o Prédio do Tesouro, o Quartel da Polícia (no bairro da Luz), a Secretaria de Agricultura, a Escola Prudente de Moraes, a Escola Politécnica (da qual foi diretor posteriormente) e o Liceu de Artes e Ofícios. São da autoria de seu escritório, ainda, os prédios da empresa de energia elétrica Light (onde atualmente é o Shopping Light) e do Mercado Municipal de São Paulo, além de diversas casas de barões do café. A famosa Casa das Rosas, na avenida Paulista, foi um projeto dele para presentear sua filha, e é uma das poucas casas da época que não foi demolida; foi tombada como patrimônio histórico da cidade e funciona como um centro cultural.
Dois italianos que trabalhavam com Azevedo, Cláudio Rossi e Domiziano Rossi, foram responsáveis pelo desenho do prédio do Theatro, cuja fachada tem inspiração clara – quase uma cópia em menor proporção – na Ópera de Paris, desenhada pelo arquiteto Charles Garnier. Os ambientes interiores têm estilo eclético, baseados no barroco renascentista e, por influência de Ramos de Azevedo, também no movimento belga da art nouveau.
Foram necessários oito anos para que o edifício ficasse pronto. Sua infra-estrutura, que conta com salões subterrâneos, túneis para circulação de ar na sala de espetáculos – uma inovação para a época –, um espaço na cúpula para ensaios de ballet, entre outros espaços grandiosos, demandou tempo, dinheiro e muita mão-de-obra, formada em sua maioria pelos imigrantes europeus que fixaram moradia em São Paulo.
O Theatro Municipal foi finalmente inaugurado no dia 12 de setembro de 1911, com toda a aristocracia paulistana presente, além de uma multidão que somava vinte mil pessoas abarrotadas em suas portas e jardins no entorno. Foi registrado pela prefeitura da época o primeiro congestionamento da história de São Paulo nesse dia: um terço dos automóveis da cidade (aproximadamente cem) estavam na região, além de muitos carros puxados a cavalo.
A ópera de estréia do Theatro foi “Hamlet”, do francês Ambroise Thomas, que foi trazida à cidade pela prestigiada companhia do cantor italiano Titta Ruffo. No entanto, alguns paulistanos queriam que o espetáculo da estréia fosse de um compositor brasileiro, e na hora foi decidido que seria tocada a introdução da ópera “O Guarani”, de Carlos Gomes, antes de “Hamlet” começar. Esse “imprevisto” acabou por atrasar toda a apresentação, que só foi terminar na madrugada do dia seguinte, sem a encenação do último ato de “Hamlet”.
Uma revista da época, A Gazeta Artística, descreveu a noite de inauguração da seguinte maneira:
"Esteve deslumbrante a inauguração do Theatro Municipal pela companhia do barítono Titta Ruffo. Desde que anoiteceu o teatro ficou interior e exteriormente iluminado. Nas vizinhanças via-se numeroso público, carros e automóveis, com pessoas da melhor sociedade, que admiravam o belíssimo panorama. O Viaduto estava repleto.`Pouco depois das 20 horas começaram a chegar os espectadores, todos em traje de rigor. A apresentação terminou as 12 horas e 25 minutos da noite, no meio ao grande entusiasmo do público. No interior do teatro foram distribuídas riquíssimas plaquetes, contendo a descrição e o histórico do teatro até sua inauguração. Durante o espetáculo foiram tiradas muitas fotografias a magnésio. No jardim permaneceram numerosas famílias até tarde da noite"14
Todas as expectativas do público paulistano foram superadas: o Theatro impressionou por sua riqueza de detalhes, sua estrutura para abrigar grandes produções, seus jardins e sua iluminação interna (feita por energia elétrica, algo extraordinário para o Brasil na época) e externa (ainda feita a gás). “Em pouco tempo, a partir de sua inauguração, o Municipal se transformou em ponto de referência, visita obrigatória para estrangeiros, passeio turístico para os paulistanos em finais de semana”
15. Como pólo cultural, sempre esteve muito presente na vida da cidade. Seu bar, que também funcionava como salão de chá, com mesas na calçada, era muito freqüentado – atualmente só funciona em dias de espetáculo, e não possui mais mesas ao ar livre – e seus salões foram usados para bailes de carnaval e formaturas até o início dos anos 50.
Alguns dos grandes acontecimentos da vida cultural de São Paulo aconteceram no Theatro, porém, um deles se destaca por sua característica de “revolução cultural” que refletiu no país todo: a Semana de Arte Moderna, realizada nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922. O movimento iniciado na década anterior por artistas como Anita Malfatti, Lasar Segall, Oswald e Mário de Andrade, entre outros, teve o seu ápice durante essa Semana, em que foram apresentadas obras de pintores, escultores e arquitetos modernistas, além de concertos e conferências. Dentre os artistas expositores estavam os arquitetos Antonio Moya e George Prsyrembel, os escultores Vítor Brecheret e W. Haerberg e os desenhistas e pintores Anita Malfatti, John Graz, Martins Ribeiro, Zina Aita, João Fernando de Almeida Prado, Ignácio da Costa Ferreira, Vicente do Rego Monteiro e Di Cavalcanti (o idealizador da Semana e autor do desenho que ilustra a capa de seu catálogo). Os eventos da Semana de 22 foram o marco da presença entre os brasileiros de uma nova forma de fazer e compreender a arte, assim como enfatizaram a importância de que fosse feita no Brasil uma arte inspirada não mais nos padrões europeus, mas sim na “brasilidade”, no que o país tem de genuíno. É possível dizer que a realização da Semana de 22 no Theatro Municipal foi uma afronta ao pensamento da elite paulistana que freqüentava o Theatro na época, e sob o qual ele foi idealizado e construído.
O Theatro teve em seu palco grandes nomes da música erudita internacional: por ele passaram Maria Callas – diz-se que a famosa rivalidade entre a diva da ópera e outra soprano, Renata Tebaldi, começou em São Paulo em 1951, quando ambas vieram para montagens diferentes da “La Traviata” de Verdi, no Municipal –, a brasileira Bidú Sayão (prima donna da Metropolitan Opera, de Nova Iorque, e de grande renome no exterior), Enrico Caruso, Tulio Serafin e Arturo Toscanini, por exemplo. Nele também foram vistas lendas do ballet como Isadora Duncan, Margot Fonteyn, Rudolf Nureyev, Mikhail Baryshnikov e Vaslav Nijinsky. Algumas personalidades internacionais que também já pisaram em seu palco foram Vivien Leigh, Ravi Shankar e Ella Fitzgerald, entre outras, para apresentações além daquelas relacionadas à música erudita.
No decorrer de seus noventa e cinco anos, o Theatro Municipal passou por duas grandes reformas. A primeiras delas, iniciada em 1951, foi comandada pelo arquiteto Tito Raucht, e foi marcada por profundas mudanças na sua arquitetura interna. Entre o período de 1951 e 1955 foram criados novos pavimentos para abrigar os camarins, diminuiu-se o número de camarotes para dar lugar ao órgão Giovanni Tamburini, de fabricação italiana – órgão este um dos maiores do país – e foram ampliados os balcões, aumentando o número de lugares na casa para a quantidade atual (1580 lugares, distribuídos em platéia, frisas, camarotes, balcão nobre, foyer, balcão simples, galeria e anfiteatro). Durante essa reforma o edifício foi pintado, o que acabou por encobrir grande parte do trabalho de afrescos italianos original, e o veludo que cobria as poltronas (o mesmo das cortinas do palco) foi substituído de verde – que originalmente era um dos parcos elementos que representavam a “brasilidade” no Theatro – para vermelho. Esta primeira reforma, de certa forma, descaracterizou o projeto original do escritório de Ramos de Azevedo.
No entanto, em 1981 o Municipal foi tombado pelo CONDEPHAAT, associado ao IPHAN, portanto, a partir desse momento nenhuma outra alteração poderia ser feita em sua estrutura e/ou decoração sem a autorização do mesmo. Estando o Theatro num estado lastimável, em 1986 a segunda reforma começou sob a prefeitura de Jânio Quadros. Dessa vez, quase todos os elementos legítimos da construção foram restaurados: a maior parte dos afrescos foram recuperados, o veludo com a tonalidade verde original foi recolocado em poltronas, cortinas do palco e outros detalhes decorativos, e a fachada – que estava bastante deteriorada, em especial as placas de arenito, material de tom rosado que cobre a alvenaria externa – foi inteiramente recuperada. Para tanto, já sob a prefeitura de Luíza Erundina, as minas de onde foi retirado esse arenito na época da construção foram reabertas, pois estavam desativadas há muitos anos. Algo muito representativo dessa nova reforma, também, foi a “redescoberta” de um espaço subterrâneo no edifício, que hoje é conhecido como Salão dos Arcos: ele estava soterrado desde a primeira reforma, e ao ser recuperado – e condicionado com iluminação e refrigeração adequadas – tornou-se uma sala de exposições muito utilizada. O término das obras se deu em 1991, quando o Theatro foi reinaugurado em comemoração dos seus oitenta anos.
Este ano o Theatro Municipal completou noventa e cinco anos de sua inauguração, com um número de apresentações cada vez maior (e de óperas, que gradualmente voltaram a ser apresentadas; somente este ano são oito montagens: “As bodas de Fígaro”, “A flauta mágica”, “Bastião e Bastiana”, “Orfeu”, “Andrea Chenier”, “La Gioconda”, a estréia mundial “Olga” e “João e Maria”; no ano passado foram cinco) – ainda não comparável ao das primeiras décadas de funcionamento, quando ele chegou a receber até mais de trinta encenações num único ano – e um público fiel, sempre presente. Durante a semana do dia 12 de setembro, foi apresentada uma programação especial: dois espetáculos inéditos, protagonizados pelo Balé da Cidade de São Paulo, Orquestra Sinfônica Municipal e Orquestra Experimental de Repertório. Os dois primeiros apresentaram coreografia inédita para música do compositor brasileiro Radamés Gnattali, e o último dedicou-se a uma edição do projeto “Cinema em Concerto”, no qual foi apresentada a música do compositor russo Dmitri Shostakovich. A atual direção artística do Municipal está a cargo do maestro Jamil Maluf – regente titular da Orquestra Experimental de Repertório – responsável pelo re-direcionamento da programação do Theatro, de forma a, em suas palavras, “reconduzir este teatro a sua verdadeira vocação para a ópera e o ballet”
16.
Contudo, alguns fatores se fazem notar ao longo dos anos, como o descaso da administração com a manutenção a qual o Theatro deveria ser submetido, além da deterioração da região em seu entorno – os jardins originais foram substituídos pela pavimentação e os seus arredores ficaram repletos de prédios comerciais e escritórios, além da população de rua que se abriga em suas escadarias e na praça Ramos de Azevedo –, contribuíram para que ele voltasse a necessitar uma atenção maior. Atualmente trabalham cerca de seiscentas pessoas – de acordo com a funcionária responsável pela visita monitorada, contando com os membros dos corpos estáveis – para que a casa funcione, e ainda assim pode-se notar em detalhes do edifício a falta de cuidado: pode-se ver, por exemplo, o pedaço de um dos vitrais das portas do Salão Nobre colado com fita adesiva transparente, para que não caia, dentre outros problemas decorrentes da falta de manutenção adequada.
De acordo com funcionários do Theatro – e com a grande imprensa, que já divulgou a notícia –, está prevista uma terceira grande reforma com início em dezembro do presente ano. O prédio ficará fechado pelos primeiros quatro meses e reabrirá para apresentações em março de 2007, porém a reforma só tem término previsto para junho de 2008. Ela visa não somente recuperar a fachada, os vitrais e as pinturas das paredes da sala onde funciona o bar, mas o objetivo principal é modernizar os equipamentos de cenário e iluminação, e melhorar a acústica tanto para a platéia quanto para os músicos. A reforma, orçada em aproximadamente R$ 3,8 milhões, será financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e será chefiada pelo arquiteto especialista em acústica José Augusto Nepomuceno, que também foi responsável pela acústica da Sala São Paulo.
O Theatro Municipal de São Paulo não é somente um edifício de arquitetura grandiosa que se destaca em meio à praça Ramos de Azevedo, uma lembrança de uma belle époque da sociedade paulistana ou um patrimônio da cidade: ele representa grande parte dos principais momentos da história cultural paulistana e continua participando de sua construção. A população da cidade nunca deixou de ir ao Theatro e lotar a casa em dias de espetáculo, ainda mais atualmente, com a política de preços mais acessíveis e a venda antecipada de ingressos. No entanto, grande parte das pessoas que vão ao Theatro – ou daquelas que passam todos os dias em frente, a caminho do trabalho, ou ainda dos diversos turistas brasileiros e estrangeiros que percorrem o centro – não conhece sua história e todo o trabalho que é feito diariamente para manter seu funcionamento. Não conhece, ainda, a necessidade existente da preservação deste espaço, para que ele permaneça sendo uma parte do cotidiano dos paulistanos e do imenso número de atrativos culturais que São Paulo pode oferecer aos turistas que passam pela cidade.
3. A visita monitorada atual: descrição
(Observação: não foram analisadas as visitas monitoradas feitas aos sábados, visto que têm o mesmo conteúdo das demais, porém fazem parte do projeto Turismetrô e não diretamente do Theatro Municipal).
Para atender à demanda de visitantes e turistas que têm vontade de conhecer o Theatro Municipal, seus ambientes e sua história, foi criada uma visita monitorada, com duração de aproximadamente uma hora. Atualmente ela está disponível ao público gratuitamente, por meio de agendamento através de um telefone encontrado no site da prefeitura de São Paulo, e acontece de terça a quinta-feira, às 13h, e aos sábados, às 9h30 e às 10h30. A monitora atual, formada em arquitetura, está no cargo há quatro anos, e discorre sobre a história do Municipal e sua importância como patrimônio da cidade de forma simples e concisa, e por vezes um pouco confusa.
Para a realização deste trabalho, a visita monitorada foi assistida e analisada três vezes ao longo do ano. Pôde-se notar divergências entre as informações passadas, por exemplo, na data de início da primeira reforma: houve variação na informação, de 1951 (nas duas primeiras visitas, feitas em fevereiro e março) para 1953 (na terceira visita, em setembro). Da mesma forma, houve a omissão de algumas informações em uma ou em outra visita, como a do significado dos mosaicos que decoram as paredes do Salão Nobre que dão para o hall principal (representações de duas óperas de Richard Wagner) que não foi explicado na terceira visita.
Além da análise da visita, foi feita uma breve entrevista via e-mail com a monitora (anexa ao final deste trabalho), para reunião de informações sobre o funcionamento, objetivos e planejamento da monitoria por parte dos responsáveis pelo Theatro. Os questionamentos serão comentados a diante.
A seguir, a monitoria será descrita em detalhes – com base na visita feita mais recentemente –, apresentando os ambientes visitados, em ordem, e especificando as informações passadas em cada um deles:
a. Hall principal: Diante da escadaria principal, o grupo é reunido pela monitora para que ela se apresente e dê avisos gerais. São eles: duração da visita, permissão para tirar fotos (com ou sem o uso de flash) – exceto na platéia, que é proibido pela direção artística do Theatro – e um pedido para que o grupo mantenha-se junto. Deste ponto saem todos pela lateral do hall para a entrada da platéia.
b. Platéia: É neste ambiente que a visita se prolonga mais: cerca de trinta minutos. A monitora pede para que o grupo se sente na platéia, pois é no espaço que a história do Theatro propriamente será contada. Reitera o pedido de não tirar fotografias, e começa explicando sucintamente a diferença entre um teatro de ópera e os demais teatros, pela presença do fosso da orquestra. Na seguinte ordem, fala sobre:
• a boca de cena;
• o funcionamento do fosso da orquestra;
• o início da construção do Theatro;
• Ramos de Azevedo e os Rossi (funcionários de seu escritório) e faz menção a outras edificações construídas por ele em São Paulo;
• os acontecimentos da inauguração do Theatro;
(neste momento, ela interrompe para dizer o número de funcionários da casa atualmente)
• voltando à inauguração, ela comenta que a ópera apresentada, em suas palavras, foi “‘Hamlet’, de Shakespeare” (na realidade, a ópera é de autoria do francês Ambroise Thomas, baseada no texto do escritor inglês);
• os assentos da galeria no alto do prédio, que foram projetados para, em suas palavras, “os mais ‘pobrinhos’”;
• volta à boca de cena e os fundos do palco, para explicar sobre o sistema de elevadores dos cenários do Theatro;
(neste momento é citado que o prédio será fechado em dezembro próximo por quatro meses, para reforma, e que esta terá duração total de um ano e meio)
• menciona quando começou a primeira reforma (quando se dá a primeira incoerência com relação às outras visitas analisadas, entre as datas de 1951 e 1953) e o que foi alterado na estrutura do Theatro durante a mesma;
• outras utilizações dos salões do Theatro nos seus primeiros quarenta anos (neste momento, ela aponta para um dos visitantes e diz: “quem é mais ‘antiguinho’ se lembra, né?” – referindo-se aos bailes de carnaval dados no Salão Nobre até o início década de 1950);
• tombamento pelo CONDEPHAAT (órgão que ela não menciona) em 1981;
• o segundo restauro (sem mencionar detalhes);
• decoração interna: balcões ornados com folhas de ouro e vidro amassado e pintado;
• valor gasto na construção, entre 1903 e 1911 (4500 contos de réis);
• o lustre belga da platéia, de duzentas e vinte lâmpadas, homenagem de Ramos de Azevedo ao país onde estudou engenharia e arquitetura;
• a pintura do teto da platéia, do brasileiro Oscar Pereira da Silva (“A consagração do Herói”);
• o compositor brasileiro Carlos Gomes (patrono do Theatro, esculpido em gesso no teto da platéia);
• a Semana de Arte Moderna de 1922 (que ela diz ser o acontecimento “mais importante” que o Theatro já recebeu, mas não explica o que foi, nem qual a sua real importância);
• valor do aluguel do Theatro para eventos culturais;
• e, por fim, menciona que a decoração do Theatro como um todo teve inspiração na mitologia grega.
Durante o tempo em que a monitora discorre sobre os assuntos de forma desordenada, o grupo está sentado. Em seguida, são todos chamados para deixar a platéia, e seguem para uma escadaria lateral que desce para o Salão dos Arcos.
c. Salão dos Arcos: O ambiente é visitado rapidamente. Aqui, a monitora explica que ele funcionava originalmente como depósito, e estava soterrado até a segunda reforma, quando foi recuperado para se tornar uma sala de exposições. Diz que este é considerado o espaço mais novo do Municipal. É no Salão dos Arcos também que é explicado o porque dos túneis que dão na praça Ramos de Azevedo, e que eles dão margem a histórias que já viraram lendas do Theatro (como a dos gatos que entram por esses túneis e acompanham músicos e cantores em espetáculos, e que eles eram usados para esconder pessoas “durante a Revolução” – revolução esta que ela não especificou).
Saindo deste ambiente, o grupo sobe por outra escadaria interna, passando por um dos túneis de ventilação do Theatro. A monitora explica rapidamente a função antiga dos túneis e segue subindo em direção à cozinha.
d. Cozinha: O Municipal tem uma cozinha industrial, que era utilizada na época em que ele ainda mantinha o bar/salão de chá, mas que foi modernizada durante a segunda reforma para ser utilizada quando há coquetéis e outros eventos. De acordo com a monitora, ela não poderia ser visitada pelo grupo, porque é de uso dos funcionários e a direção artística não permite, mas que ela gosta de levar o público “para aumentar o tempo da visita”. No entanto, não há parada para observação, o grupo passa direto por ela. Saindo de lá, entra pelos fundos do salão onde funcionava o antigo bar.
e. Salão do Bar: Chegando no salão, a monitora conta o porque do estado lastimável de degradação das paredes – antes do tombamento, as administrações que passavam pelo Theatro utilizavam o salão como escritório, e cobriam as pinturas italianas originas com tinta. De acordo com a monitora, somente agora o trabalho de restauro está sendo feito, pouco a pouco, e mostra um pequeno trecho da pintura já restaurado no alto de uma das paredes. Pôde-se observar então que desde a segunda visita feita para este trabalho, em março deste ano, não houve avanço no processo, pois o mesmo trecho já havia sido mostrado por ela na época. Neste momento é falado de forma bem superficial sobre o processo de restauração, mas não é enfatizada a sua importância para a preservação do patrimônio.
Passando rapidamente pela escultura (cujo nome não foi mencionado na visita mais recente) “A caçadora”, de Vítor Brecheret, o grupo volta ao hall principal, para subir a escadaria e seguir até o Salão Nobre.
f. Salão Nobre: O espaço rico em ornamentos, de arquitetura art nouveau (estilo esse que não é explicado para o grupo), é utilizado para exemplificar a quantidade de materiais vindos do exterior para a construção do Municipal: a monitora menciona e mostra os mármores italianos, os vitrais alemães e os espelhos franceses e fala, rapidamente, dos elementos brasileiros na sala: o piso feito em madeira e a pintura do teto, também de autoria de Oscar Pereira da Silva. É explicada também a função de espaço social – para eventos da prefeitura, por exemplo – do Salão. De acordo com a monitora, “a [ex-prefeita de São Paulo] Marta [Suplicy] usava muito essa sala...”.
Nesse momento, ela se lembra de algo que esqueceu de mencionar quando estavam ainda na platéia: “aquela figura em gesso no alto da boca de cena é ‘O Nascimento de Vênus’!”.
A porta de uma das sacadas – a que dá vista para a praça Ramos de Azevedo – é aberta, para que os visitantes tenham uma visão panorâmica de parte do centro antigo da cidade, e logo são todos guiados para o hall de entrada do público dos camarotes e balcão nobre, onde é aberto o camarote reservado para o prefeito, para que se tenha por um instante a visão completa do palco e do fosso da orquestra.
A visita termina então nesse momento, quando o grupo é novamente guiado para o hall principal, e a monitora encerra dizendo que “era isso que vocês podiam ver”.
4. Comentários sobre a visita monitorada atual
De acordo com Graham Black (apud DRUMMOND; YEOMAN, 2004), para que a visitação de um patrimônio seja de qualidade – o que implica, sumariamente, em equilibrar a satisfação das necessidades do turista/visitante e preservar o local para o futuro – é necessário primeiramente que haja a sua interpretação, proposta que ele define como:
O processo de comunicar às pessoas o significado de um lugar ou objeto, de forma que elas desfrutem mais, entendam melhor o seu patrimônio e ambiente, e desenvolvam uma atitude positiva à conservação. [...] Muitas apresentações de patrimônio são informações conduzidas. [...] O desafio é despertar a curiosidade dos visitantes, envolvê-los e empenhá-los com o local.[i]
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De acordo com o questionário respondido pela monitora do Municipal, foi originalmente pensado como principal objetivo da visita monitorada dar uma oportunidade para as pessoas conhecerem o Theatro, principalmente àquelas que não podem assistir a um espetáculo, por qualquer motivo. Analisando a visita sob esta ótica específica, e levando-se em conta que ela permite que o turista/visitante transite por determinados ambientes do edifício, pode-se dizer que seu objetivo é cumprido apenas em parte: o visitante tem uma experiência visual marcante, garantida pela exuberância e imponência da construção tanto no seu exterior quanto no interior, que é incompleta porque não há um envolvimento maior do indivíduo: ele apenas recebeu informações.
A informação acerca do histórico do Theatro não é selecionada: ela segue, em sua maior parte, o texto que se encontra no site da prefeitura de São Paulo, e as intervenções feitas pela monitora estão muitas vezes fora do contexto do que está sendo apresentado no momento. Essa informação, portanto, torna-se vazia e sem significado para os turistas/visitantes, que na maioria das vezes são leigos e permanecem dessa forma, por não ter absorvido e/ou compreendido o que foi contado. Sendo assim, o objetivo da visita se perde, já que não pode ser sustentado apenas pela experiência visual. De acordo com Black novamente,
“a ênfase deveria ser colocada em manter significados em lugar de fatos. Deveria haver hierarquia de informação disponível, de forma que para esses que querem ‘descobrir mais’ possam fazer assim”18.
Não há informações sobre quem é responsável pela seleção do conteúdo a ser transmitido, sabe-se somente que este foi pesquisado e recolhido nos arquivos do Museu do Theatro Municipal (MTM), localizado nos Baixos do Viaduto do Chá.
O Museu reúne vinte mil programas do Theatro, seis mil fotos, e entre outros elementos, o maior acervo de partituras da América Latina. Dirigido pelo também escritor e diretor de teatro Márcio Sgreccia, é um espaço aberto a visitação gratuita – está fechado atualmente para o término de uma reforma, previsto para abril passado, e reabrirá com uma exposição permanente nova – que expõe fotos, textos, figurinos e objetos de interesse relacionados ao Theatro e sua história, e que não é incluído na visita monitorada: apenas é rapidamente mencionado. Além de fornecer as informações, não há outro vínculo entre o Museu e a visita, ainda que, de acordo com o que foi mencionado na entrevista, esporadicamente um funcionário do Museu possa vir a substituir a monitora quando há a necessidade – em caso de falta ou folga. O MTM é uma fonte de informação que satisfaz a vontade daqueles que “querem descobrir mais” e não o conseguem com a visita, mas que não é aproveitada devido ao fato de o turista/visitante não ter conhecimento do espaço, ou ainda, não ser incentivado a visitá-lo.
Tanto o turista que vem à cidade pela primeira vez quanto o visitante paulistano que nunca havia entrado no Municipal antes foram movidos por um interesse, uma curiosidade, uma vontade de “querer descobrir mais”; se eles são tratados como “recipientes passivos de informação”[i] 19, não somente sentem-se distantes da realidade que aquele patrimônio condensa, como também não têm suas necessidades satisfeitas.
Ao analisar a situação dos turistas estrangeiros que se propõem a visitar o Theatro – que, como foi observado durante as três visitas analisadas, compõem normalmente quase a metade dos grupos, e em sua maioria são provenientes da Europa ou da América Latina –, o caso é ainda mais problemático: não há qualquer tipo de informação em línguas estrangeiras que os auxiliem, desde o conteúdo do site da prefeitura, passando pelo atendimento e agendamento da visita ao telefone, a própria monitoria e a sinalização dos ambientes do Theatro. Dessa forma, fica evidente que esse turista tem uma experiência ainda mais superficial, pois não somente não absorve o conteúdo que está sendo transmitido, como sequer compreende o que está sendo dito ou indicado. Na maioria das vezes, ele é auxiliado pelos próprios visitantes, que tendo algum conhecimento de outras línguas são capazes de ajudá-lo a integrar-se ao ambiente e ao que está sendo contado.
Conforme dito na entrevista, não foi exigida nenhuma formação – sequer em língua inglesa e/ou espanhola em nível básico – para que o cargo de monitor fosse preenchido, apenas foi necessário o conhecimento do histórico do Theatro. Foi dito também que não há material de apoio ao turista estrangeiro, em texto ou áudio, porque há falta de verba para tanto. Estas são falhas graves na estruturação da visita monitorada, visto que a ausência desses elementos de apoio ao estrangeiro praticamente o exclui da experiência. É importante mencionar também que mesmo que a visita seja oferecida gratuitamente por um órgão público, ela não deixa de ser um serviço turístico, que deve ser o mesmo – e ter a mesma qualidade – para todos aqueles que o procuram, independentemente do lugar de origem do turista/visitante. Nesse aspecto há defasagem no serviço prestado para este determinado público em relação aos demais.
Após uma série de visitas técnicas, leituras a respeito do tema e diversas reflexões, o presente trabalho de conclusão de curso propõe um novo formato para a visita monitorada do Theatro Municipal de São Paulo, de forma a melhor aproveitar o seu espaço e proporcionar uma experiência mais completa e significativa ao turista/visitante.
A proposta inclui também a preparação de material de apoio ao turista brasileiro e estrangeiro, em formato de folder (cujo modelo está anexado ao trabalho), com texto elaborado em três línguas – português, inglês e espanhol – que servirá como um guia visual para a visita.
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