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Recuperação da Fonte do Itororó
Jandira Adegas
setembro/2004
 

"Eu fui no Itororó
Beber água e não achei
Encontrei bela morena
Que no Itororó deixei"1


Encontramos o nome Tororó, do tupi Itororó, significando “regato pequeno” em várias regiões do Brasil. Em Salvador, o dique do Itororó, por ser o único manancial natural da cidade, foi tombado pelo IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional -. Possui uma lagoa com área de lazer, figuras dos Orixás no meio do lago, um local de atração turística com grande área verde.

A referência é encontrada também em Guaratiba, no Paraná e nos estados do Espírito Santo, Ceará, Santa Catarina, entre outros. A música, segundo Veríssimo de Melo2, é conhecida em diversas regiões do Brasil. O escritor Augusto Cesar Pires de Lima3, relata que em Portugal existiu uma versão sem letra, sendo que na segunda parte da brincadeira, as crianças dançam e cantam, conforme a letra brasileira.

Por várias gerações, essa cantiga de roda permaneceu na lembrança daqueles que vivenciaram uma época onde o lazer simples e usufruído nas ruas do bairro, popularizando a Fonte do Itororó, tornando-a conhecida não somente em Santos, mas em várias partes do país. No livro "Ribeiro Couto ainda ausente"4, sobre a vida do poeta, encontramos também referência a ela:

"Depois das aulas, Jaime Franco, Rui e outros meninos brincavam na Fonte do Itororó onde bebiam água, antes de subir o Monte Serrat para visitar a imagem de Nossa Senhora, guardada na igreja. Na descida, entre peraltices próprias da idade, bebiam garapa (caldo de cana de açúcar muito comum em Santos) e comiam rapadura, preparadas pelos moradores do morro."

A fonte, situada no chamado Recanto do Itororó, localizada no sopé do Monte Serrat, recebeu essa denominação devido ao ribeiro do mesmo nome que atravessava algumas ruas da região central (do Rosário e XV de Novembro), em direção ao mar. Esse recanto era um lugar aprazível, como relata Arnaldo Ferreira Marques, historiador do CONDEPASA - Conselho de Defesa do Patrimônio de Santos -, em artigos para o jornal A Tribuna: "as pessoas passeavam pelo Itororó atraídas tanto pela temperatura amena que a mata existente proporcionava, quanto pela água fresca que brotava da fonte".

No local, muito freqüentado pelos santistas e pelas lavadeiras públicas da época, funcionou a "Companhia de Águas do Itororó", que engarrafava as águas límpidas e cristalinas da fonte e propagava a lenda de que quem dela bebesse nunca mais deixaria a cidade.

A antiga fonte serviu ao público até a década de 1930. Posteriormente, com a canalização da água pela Prefeitura, foi condenada, degradada e, conseqüentemente, desativada, caindo no esquecimento e no descaso das autoridades municipais: “Eu fui no Itororó, beber água e não achei...”

Assim permaneceu por muito tempo: ignorada, abandonada e sem nenhuma referência à sua origem, apesar de estar localizada em uma área de intenso movimento, tanto pela circulação da população residente nas imediações, como dos turistas que se dirigem ao Monte Serrat. Preservado, somente o local onde a água da nascente ainda corre, este porém, não acessível ao público, uma vez que se encontra situado nas dependências internas da Coordenadoria de Energia Elétrica da Prefeitura. A água, atualmente represada em um tanque, transformou-se em moradia de tilápias (peixe de água doce), e como registro histórico, apenas uma placa, com a seguinte inscrição: "Águas do Itororó".

A partir das críticas da população, preocupada com a preservação desse bem patrimonial, a Prefeitura efetuou pequenos trabalhos, para dar visibilidade à Fonte: pintura e reparações no piso e no jardim, placa com informações sobre o local e a transcrição da letra da música, cuja melodia é de domínio popular.

Apesar de ser considerado, pelos moradores, um patrimônio cultural da cidade, a fonte não é um bem tombado pelo CONDEPASA, porém, é protegida por estar inserida na área envoltória da Capela de Nossa Senhora do Monte Serrat e na zona de proteção cultural do Centro Histórico de Santos, definida pelo Projeto Alegracentro.

A Fonte do Itororó faz parte dos atrativos turísticos da cidade de Santos, como um dos locais que pode ter servido de inspiração para a alegre canção que embalava as brincadeiras de ciranda e os lazeres de uma época não tão distante.
 
1 cantiga popular de autor desconhecido.

2 MELO, Veríssimo de. Folclore Infantil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1981). Autor também de Rondas Infantis Brasileiras. São Paulo: Departamento de Cultura, 1953.

3 LIMA, Augusto César de. Jogos e Canções Infantis. Porto, Portugal: Domingos Barreira Editora, 1973.

4 TEIXEIRA, Milton. Ribeiro Couto ainda ausente. Santos: Universidade Santa Cecília dos Bandeirantes, 1989.