RESUMO: O artigo discute um dos episódios da guerra com o Paraguai ocorrido em Mato Grosso do sul, no qual morreram mais brasileiros do que na batalha do Tuiuti e a elaboração de estudos para a implantação da trilha da Retirada da Laguna e do Museu da Guerra com o Paraguai, a fim de inserir o estado no roteiro turístico internacional de visitação histórica.
ABSTRACT: This article talks about the Paraguay War`s episode in Mato Grosso do Sul when several Brazilian soldiers died during the battle and the possibility to create a tourism track based on this fact.
Questionado sobre que conselho daria a um jovem que estivesse iniciando a carreira de historiador, afirmou o eminente historiador inglês Eric J. Hobsbawn: nunca confundir fato e ficção, evitar pensar em termos nacionais, tentando enxergar a história de modo global; e evitar ser apenas um colecionador de fatos2.
Tomando por base esses pressupostos, os quais, em última análise, remetem a um critério do que deveria ser o procedimento estritamente científico do historiador, tem-se o nível de complexidade a que somos levados ao pensar a guerra com o Paraguai, fato ao qual, desde 1999, parcelas da sociedade sul-mato-grossense tem se reportado por ocasião das “marchas” que revivem o episódio conhecido, nos registros da história do Brasil, como a Retirada da Laguna.
Apoiado por diversas instâncias governamentais do estado, tendo como parceiros, entre outros, o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul (IHGMS) e o Conselho Internacional de Museus (ICOM), as motivações desses eventos são, conforme o projeto intitulado Complexo Turístico Cultural da Força Expedicionária de Mato Grosso, de caráter histórico e turístico. Assim, ao enfatizar “um dos episódios mais marcantes da guerra com o Paraguai ocorrido totalmente em solo sul-mato-grossense, no qual morreram mais brasileiros do que na batalha do Tuiuti”, objetiva-se a elaboração de estudos para a implantação da trilha da Retirada da Laguna e do Museu da Guerra com o Paraguai, a fim de inserir o Mato Grosso do Sul no roteiro turístico internacional de visitação histórica.
É na história, acima de tudo, que se pretende buscar legitimidade para as ações a serem desenvolvidas no presente. Contudo, Hobsbawm lembra que a operação histórica requer a elisão de toda e qualquer confusão entre fato e ficção, com o estatuto da verdade daquele sendo fornecido pelas fontes, escritas ou não. Ao mesmo tempo alerta, como já havia feito Walter Benjamin3, que o historiador deve evitar ser apenas um colecionador de fatos, sob o risco de incorrer na tradição “historicista”. Noutros termos, é preciso que o historiador seja crítico em relação ao seu objeto de estudo e às suas fontes.
Dentre as fontes que remetem à “Guerra do Paraguai”, a mais popular junto aos sul-mato-grossenses e aquela à qual, geralmente, recorrem todos os que pela primeira vez pretendem entrar em contato com o assunto, talvez seja o livro A Retirada da Laguna escrito por Alfredo D´Escragnolle Taunay.
Constituída pelos principais eventos que envolveram, entre os meses de janeiro e junho de 1867, a coluna expedicionária brasileira durante a missão à fronteira do Apa, essa obra foi escrita basicamente a partir das reminiscências do autor, uma vez que a maior parte de suas anotações de viagem e os desenhos elaborados para o “Álbum de Vistas”, que seu pai lhe entregou quando saiu do Rio de Janeiro, encarregando-o de trazê-lo “todo cheio de paisagens e dos melhores pontos de vista que fosse encontrando pelo caminho”, foram praticamente destruídos pelos paraguaios no ataque à vila de Nioaque.4
Sobre o processo de criação de A Retirada da Laguna, registrou Taunay em suas Memórias que, de volta ao Rio de Janeiro, mal contou ao pai as “pungentes e dramáticas peripécias” vividas pela coluna expedicionária em território mato-grossense, este o fez prometer que, aproveitando a memória ainda fresca dos fatos, iria fixá-los num livro. Promessa cujo cumprimento formal, como o próprio autor admitiu, seria constantemente adiado, presa que se sentia da “pouca disposição que inutiliza tantas belas inteligências da nossa mocidade e dos nossos mais ilustres homens, rebeldes ao uso da pena”. Quando finalmente resolveu iniciar o trabalho tantas vezes adiado, acabou por reconhecer as “grandes lacunas nas reminiscências”. Faltava-lhe não só clareza do desenrolar cronológico dos acontecimentos – “confundiam-se datas, os dias e até mesmo os meses” -, como dos fatos capitais, “indispensáveis à narração”, não tinha senão “lembrança mal esboçada, flutuando tudo numa indecisão” que logo lhe retirou o desejo de continuar, “tão falto de elementos para fazer coisa que prestasse”. A solução para o impasse viria, como sugeriu o autor, do inconsciente:
Certa noite, acordei, a horas mortas, perdi todo o sono e na vigília, todos os fatos da Retirada se me reproduziram, de modo tão claro e tão terrível, que tive violentos calafrios e tremi de emoção e positivo medo. Não perdi, porém, o momento de súbita inspiração. Acendi a vela, saltei da cama e durante mais de duas horas seguidas tomei febrilmente notas de toda a minha história. E houve trechos em que experimentei os arrepios e o pavor da morte, a rememorar por modo tão vivo e inesperado as cenas e os horrores que presenciara e tão depressa iam me fugindo da lembrança. [...] Dentro daquela semana prontifiquei as duas primeiras partes, que meu pai levou a São Cristóvão para que o Imperador lesse. [...] Creio que escrevi a Retirada da Laguna em vinte e poucos dias.5
Visto dessa maneira, de que forma deve ser encarado esse livro? Como documento histórico, com o termo documento tomado aqui em seu sentido moderno, ou seja, enquanto testemunho escrito que dá fundamento ao fato histórico, ou como obra literária?
Para responder à questão recorro a Walter Benjamin, de quem retomo especificamente o conceito de “ruína alegórica” por ele atribuído à obra de arte, com a finalidade de tentar iluminar certos aspectos da natureza da obra literária, em especial sua relação com a história.
Ao reativar, às avessas, o conceito de obra de arte como “promessa de felicidade”, Walter Benjamin a definiu como índice de perda de uma felicidade que poderia ser ou ter sido, mas não é, exceto como obra de arte. Exatamente por registrar o “outro” do que poderia ter sido e não foi a obra de arte – aqui incluída a literatura – constitui-se, ao mesmo tempo, em ruína e alegoria.
Enquanto ruína, em sua relação com a história, a obra literária pode e deve ser confrontada com duas outras categorias muito próximas: o monumento e o documento. Diferente do monumento, que indicia intencionalmente o passado podendo tornar-se artístico quando tem alguma validade estética em si, por não ter sido aprioristicamente originado com a intenção de testemunhar algo historicamente relevante, mesmo que a posteriori possa ser usado para formar tal testemunho, o documento indicia o passado de forma não proposital trazendo-o, como “resto do que foi”, a presentes posteriores. O mesmo pode ser dito a respeito da obra literária, na medida em que também ela transcende o mundo que a gerou, testemunhando-o para outros tempos e lugares.
Entretanto, num esforço de evitar que a obra literária se transformasse em mero documento a serviço de alguma ideologia, ou então que não fosse reconhecida e estudada em sua especificidade, nas “Treze teses sobre os esnobes”, publicadas em 1928, Walter Benjamin insistiu no fato de que a obra literária, embora também pudesse ser considerada documento, afastava-se dele em razão de sua própria natureza, devendo, portanto, ser analisada como obra literária, ou seja, enquanto mundo ficcional que conta a história que poderia ter sido e não a que foi.
A rigor, Benjamin insistiu, inúmeras vezes, na idéia de que a literatura constituía-se numa “historiografia do inconsciente”. Noutros termos, mesmo não pretendendo ser, e não sendo, mero registro histórico as obras literárias acabam se transformando numa espécie de “historiografia não oficial”. Na medida em que não querem ser documentos, seu caráter autônomo lhes permite uma liberdade de registro e transmissão que escapa à “historiografia oficial”, comprometida com omissões, cortes e deformações. Além disso, a liberdade de registro que lhe é própria pode se dar até mesmo através da constituição de refúgio utópico de beleza, oposto ao social e negando-o por natureza, fato que pode ser, posteriormente, decifrado pelo crítico.
Frente ao exposto, entendo que é como obra literária – como uma “historiografia do inconsciente” – que o livro A Retirada da Laguna deve ser encarado pelo historiador. Abordá-lo criticamente, no intuito de aprofundar a sua compreensão enquanto texto literário implica na necessidade de elaborar uma reconstrução da época histórica e literária de seu surgimento para verificar, por exemplo, o horizonte de expectativas então imperantes, além do nível de consciência do autor.
Antes, porém, é preciso ressaltar que mesmo optando pela hipótese de considerar A Retirada da Laguna mero documento histórico, ainda assim o esforço para a sua decodificação não seria menor. Nesse caso, nunca é demais lembrar o que escreveu Jacques Le Goff a respeito do significado do documento e a relação que com ele deve estabelecer o historiador profissional:
O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época da sociedade que o produziu, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver [...].O documento é monumento. [...] porque em primeiro lugar o documento é [...] uma montagem [é] preciso começar por [...] desestruturar essa construção e analisar as condições de produção dos documentos-monumentos.6
Filho de Félix Émile de Taunay e de Gabriela Hermínia de Robert D´Escragnolle, barão e baronesa de Taunay, Alfredo Maria Adriano D´Escragnolle Taunay nasceu no Rio de Janeiro em 22 de fevereiro de 1843, vindo a falecer na sua cidade natal em 25 de janeiro de 1899. Portanto, durante sua curta existência, Taunay viveu o período de consolidação, auge e decadência do Império brasileiro, regime ao qual permaneceu fiel até a morte.
Eram antigos e estreitos os laços das famílias D´Escragnolle e Taunay com a família Real que governou o Brasil até 1889. O avô materno do visconde de Taunay, conde D´Escragnolle, vinha de uma das mais tradicionais famílias de fidalgos provençais, emigrados de seu país. Oficial do Exército português, o Conde D´Escragnolle transmigrou para o Brasil em 1808, acompanhando a Corte Portuguesa.
Por outro lado, quando os exércitos da coligação contra Napoleão Bonaparte entraram em Paris, em 1815, o avô paterno de Taunay, Nicolas Antoine Taunay, pintor paisagista e membro fundador da Academia de França, sofreu os reveses da política e pediu proteção ao Príncipe Regente D. João VI. Apresentando-se como um velho pintor de 60 anos e cabelos brancos, em 1816 exilou-se no Brasil acompanhando a missão composta, majoritariamente, de artistas franceses associados ao império de Napoleão. Durante os cinco anos em que aqui viveu, foi um dos fixadores da paisagem urbana do Rio de Janeiro, além de se constituir num dos fundadores da Academia Brasileira de Belas Artes. Retornando à França em 1821, deixou no Brasil quatro de seus cinco filhos, entre eles Felix Émile.7
Sob os cuidados do pai, Felix Émile Taunay, também ele pintor, diretor da Academia de Belas Artes, professor do Colégio Pedro II, preceptor e amigo do Imperador, Alfredo D´Escragnolle Taunay recebeu instrução artística de bom nível acadêmico. Em 1858, bacharelou-se em Ciências e Letras pelo Colégio Pedro II. Apesar de seu "ardente" desejo de estudar Direito em São Paulo e das intenções, manifestadas por sua mãe, para que seguisse a carreira diplomática ou se tornasse clérigo, ficou resolvido que, a exemplo de seus antepassados, o jovem Taunay seguiria a carreira militar. Não obstante a reconhecida "falta de jeito para os estudos matemáticos", em 1859 matriculou-se na Escola Central, instituição voltada, à época, para formação de engenheiros civis e militares.
Comissionado 2º tenente da arma de Artilharia em 1864, terminava o penúltimo ano da Escola Militar quando eclodiu a guerra com o Paraguai. Incorporado ao Batalhão de Engenheiros do Exército Brasileiro, tomou parte na coluna expedicionária que deveria expulsar os paraguaios do sul de Mato Grosso.
De volta ao Rio de Janeiro, em 1869 foi nomeado secretário do estado maior do Príncipe Conde D´Eu, generalíssimo das forças brasileiras em operação no Paraguai. No final da guerra, tomou parte da chamada campanha das Cordilheiras, em território paraguaio. Permaneceu naquele país até o final da campanha, sendo designado para escrever o Diário do Exército, trabalho que publicou em 1870. Terminada a guerra, regressou ao Brasil para concluir o curso de Engenharia Militar na Praia Vermelha, instituição da qual se tornou professor das cadeiras de Geologia e Mineralogia.
Em 1875, abandonou a carreira das armas para se dedicar, exclusivamente, às atividades políticas. Ligado ao Partido Conservador desde 1872, nesse mesmo ano foi indicado para a Câmara dos Deputados pela Província de Goiás, sendo reeleito em 1875. No ano seguinte foi nomeado Presidente da Província de Santa Catarina, tornando-se deputado pela mesma Província em 1881. Nomeado Presidente da Província do Paraná em 1886, foi posteriormente eleito senador por Santa Catarina. Indicado, em 1889, para a função de Ministro de Estado, abriu mão da indicação devido à sua fidelidade à monarquia. Como político, seus projetos denotam uma visão arrojada para a época, a exemplo do que dispunha sobre o casamento civil e o que advogava uma "sã política migratória".8
Em 1868, Taunay estreou na literatura com Cenas de Viagem. Trazendo motivos mato-grossenses, o livro foi lido no original pelo Imperador, que anotava a origem das palavras e corrigia, a lápis, as locuções incorretas9. A partir daí, deixou uma obra extensa e variada, que tem como referência Inocência, romance regionalista ambientado em Mato Grosso, apontado pela crítica como seu melhor trabalho. Publicado em 1872, esgotando sucessivamente mais de trinta edições em quase todas as línguas cultas, em Inocência o real interesse do autor, o que talvez seja um fator determinante do êxito do livro, era de ordem pictórica: a cor da paisagem e dos costumes que ele frui como típicos.10
Fiel às lições básicas do Romantismo, que associa história e nação para indicar o caminho que leva ao encontro da singularidade cultural de um povo, a ficção romântica brasileira foi buscar inspiração, para inventar essa singularidade, nos quadros regionais da natureza do país. Com fome e uma ânsia topográfica de apalpar todo o Brasil essa narrativa ficcional, mais do que criar tipos, personagens e enredos, fixou-se no ambiente e, praticamente, escravizou-se a ele. Assim, o que vai se formando e permanecendo na imaginação do leitor é um Brasil colorido e multiforme, que a criação artística sobrepõe à realidade geográfica e social. Essa vocação ecológica se manifesta por uma conquista progressiva do território.11
Flora Sussekind também assinala a forte presença, nessa literatura, de "uma espécie de imaginação geográfica todo - poderosa [que] deve delimitar, a seu modo, o território do Império". Através da ficção, acrescenta a autora, a "imaginação geográfica" cumpria a exigência de um melhor conhecimento do território e, na falta de um "sentimento espontâneo de nacionalidade, fortalecia, cartográfica, literária e paisagisticamente, a idéia de uma comunidade imaginária delimitada nacionalmente".12
Esse impulso de revelar uma essência nacional significou a tomada de consciência, no plano literário, do espaço geográfico - social do país, que procurou realizar o registro da maior parte das características regionais de todos os quadrantes.13 Enquanto referência espacial que poderia estar presente em qualquer região, o sertão, nos quadros do romantismo, rapidamente fez surgir uma literatura própria, originária da confluência de três elementos essenciais: o da descrição das terras brasílicas versus terra lusitana, o do mundo rural versus mundo urbano, o tempo passado versus tempo presente.14
Se o primeiro elemento confere um sentido nacional à literatura sertanista, os dois últimos referem-se à dicotomia litoral – interior que marcou profundamente as representações do território brasileiro. A partir daí o sertão assume, simultaneamente, conotação negativa, ao aparecer como lugar do rural e do passado, onde a civilização não havia penetrado, portanto, associado ao atraso; e positiva, ao emergir como espaço privilegiado onde a natureza e as verdadeiras tradições ainda sobreviviam intactas.
Se aquele último aspecto está bastante presente em autores como Bernardo Guimarães e José de Alencar, que celebraram um sertão idealizado, ou seja, enquanto lugar do encontro dos homens com a natureza e onde a civilização surgia como elemento destruidor da harmonia rural, o romantismo também abarcou uma corrente mais realista cujos autores, enfatizando a dicotomia litoral - interior, inauguraram uma nova fase da literatura sertanista do século XIX, na qual a "tensão dramática substituiria a quietude contemplativa" ou o "encanto paradisíaco" do sertão15. De acordo com Antonio Cândido, a presença marcante do sertão como quadro natural e social dos enredos dos romances regionalistas dessa fase, não resultou na eliminação da realidade humana palpitante na natureza primitiva dos cenários. Da perspectiva desse autor, o regionalismo desse período, num país como o Brasil, que "ainda se apalpa e estremece a cada momento com as surpresas do próprio corpo, foi [...] um instrumento de descoberta".16
É nessa versão, mais sóbria e densa do regionalismo romântico, que se insere a produção literária de Alfredo D´Escragnolle Taunay, profundamente marcada pela forte convicção monarquista e pela participação do autor no front mato-grossense da guerra com o Paraguai. Desse contexto histórico e cultural emerge A Retirada da Laguna.
Publicado em 1871, inicialmente em francês, a segunda língua de Taunay, e traduzido para o português em 1874, esse livro é, por muitos, considerado como um dos mais significativos do fim do Romantismo e início do Realismo, podendo ser comparado a Os Sertões de Euclides da Cunha. Em ambos os casos, obra e autor tornaram-se tão mitificados quanto os próprios eventos a que se referem.
No esforço de dar ao leitor uma idéia mais ou menos exata dos lugares onde, em 1867, ocorreram os dramáticos acontecimentos cuja narrativa se ia ler, o livro acabou por se constituir num elemento chave para a incorporação de Mato Grosso no imaginário geográfico da nação, apresentando a região como um grande e remoto "sertão", uma fronteira externa e interna do Brasil, um espaço privilegiado no qual deveriam ser fincados os marcos importantes da nacionalidade brasileira e da presença do Estado Imperial.17
São dois, basicamente, os eixos temáticos presentes na narrativa de A Retirada da Laguna: a carência estrutural que tomava conta da coluna, a qual, em linhas gerais, reproduzia-se em todas as frentes de atuação do Exército, e a constatação de que o território a ser palmilhado era praticamente desconhecido da maior parte dos brasileiros das grandes cidades. Somados, esses dois fatores teriam sido, em larga medida, responsáveis pelas terríveis provações a que foi submetida a coluna expedicionária, quase perdida nos imensos "sertões" da pátria brasileira.
Assim é que, acompanhando a trajetória da coluna expedicionária, o leitor começa a entrar em contato com os longínquos e desconhecidos sertões mato-grossenses. De Paranaíba, a coluna recebe ordens para marchar até Miranda, sendo obrigada a descer às terras baixas do "pestilento pantanal", rumo ao rio Coxim, onde a febre mataria inúmeros soldados. Em Miranda é a vez do beribéri. Em Campo Belo, os expedicionários encontram clima mais saudável e "panoramas de incomparável beleza", causadores de admiração até em homens "primitivos", pouco afeitos ao "sentimento de admiração" comum entre "povos civilizados".
Esses mesmos panoramas inspiram a descrição de um "sertão bruto", mas cheio de encantos, onde, posteriormente, se desenvolveria o enredo de Inocência. Em A Retirada da Laguna, os quadros bucólicos da natureza servem para distrair o leitor, ao mesmo tempo em que contribuem para acentuar os horrores da guerra. No conjunto da narrativa, a grandeza da paisagem ajuda a atenuar o peso da derrota. Tudo funciona como se a natureza brasileira fosse a nossa maior grandeza, nosso bem maior. Somos superiores porque a possuímos e, apesar disso, não somos bárbaros, mas heróicos descendentes de europeus, fato que garante o nosso quinhão de civilidade.
Entretanto, mesmo atravessando os trechos mais belos e generosos da natureza do sertão, ainda assim a coluna padece enormes dificuldades, resultantes da improvisação, da falta de entendimento e do personalismo dos oficiais superiores de um Exército que, apesar de todos os esforços e expectativas nesse sentido, ainda não fora capaz de se profissionalizar. Faltam alimentos e contingentes, há carência de estudos do terreno a ser percorrido, de senso de direção e de diretrizes claras de comando. Tudo isso contribuindo para aumentar a tensão entre os expedicionários, que só viria a diminuir quando foi dada a ordem para o início da marcha rumo à fronteira com o Paraguai. Chegar a esse ponto limite seria o combustível que os empurraria mais à frente, revestindo-se de uma dimensão simbólica especial:
Momento solene este, em que entre oficiais e soldados não houve quem pudesse conter a comoção! O aspecto da fronteira que demandávamos a todos surpreendeu. É que era realmente novo. Podiam alguns já tê-la visto, mas com olhos de caçador ou de campeiro, indiferentes. A maior parte dos nossos dela só haviam ouvido vagamente falar; e agora estava ali à nossa frente como ponto de encontro entre duas nações armadas, e como campo de batalha.18
Esse momento encerra um capítulo do livro e pode ser visto como uma marca da própria narrativa. Na página seguinte, leitores e personagens estão às portas do território inimigo, iniciando uma nova etapa da marcha da coluna. Aí, embora a fronteira se mostre "fantasmagórica", perdida em meio aos "cerrados insalubres que não conseguem firmar limites internacionais", ela cumpre a função de demarcar uma realidade, a distinção entre o nacional e o estrangeiro, ou seja, aquele contra quem, em tempos de guerra, pode-se lutar até a morte, sem que tal conduta seja considerada criminosa.
Uma vez expulsa da fazenda Laguna pelo Exército paraguaio, a coluna volta a perambular pelos "desertos" da Pátria, perdida, faminta, esfarrapada e doente. A salvação vem de um sertanejo, o Guia Lopes, a quem Taunay comparou ao personagem Olho de Falcão do romance O Último dos Moicanos, de Finemore Cooper.19
"Homem das solidões", o Guia Lopes que Taunay desenha para o leitor ao longo da narrativa é fisicamente forte, rude, desconfiado, supersticioso e dono de um excessivo amor próprio, sentimentos típicos de seu convívio com os selvagens, "entre os quais [...] se revela veemente pela inabalável firmeza com que suportam os mais cruéis tormentos infligidos pelo inimigo vencedor".20 Orgulhoso ao extremo de ser um profundo conhecedor da terra em que vive Lopes não admite que seus conhecimentos sejam postos em dúvida, mesmo quando fica constatado que a coluna continuava perdida.
Não obstante esses elementos, que o caracterizam como homem pouco afeito a obedecer às hierarquias formais de uma sociedade "civilizada", Lopes é descrito como um súdito fiel do Império, regime que, mesmo de longe, sabia reverenciar:
Tomara, em nome do Brasil, posse ele só, de imensa floresta no meio da qual chantara uma cruz, grosseiramente falquejada, onde esculpira a inscrição PII (Pedro Segundo) imponente madeiro, perdido no recesso dos desertos. Criava a iniciativa do sertanista domínios ao soberano.21
Pode-se afirmar que a visão de Taunay, sobre o sertão e o sertanejo, expressava aspectos de sua formação política e profissional, de militar e funcionário dedicado ao Império. Formação que combinava altruísmo e ciência, de modo a servir ao Imperador e ao Brasil, tarefas que o autor de A Retirada da Laguna encarava não só como obrigações, mas como uma missão. Assim, ele olharia o sertão e o sertanejo não como quem busca uma expressão da essência nacional, mas como "aspectos de um Brasil esquecido", ao qual só se tem acesso através das artes militares e da observação científica (histórica, botânica, filológica, mineralógica, etc.), da incorporação territorial e da integração civilizatória, sob os auspícios da Coroa.
Na antecipação de aspectos que ganhariam maior relevância após a instauração da República, dentre os quais a percepção do sertão enquanto fronteira de recursos humanos e naturais inestimáveis para o Brasil, ao mesmo tempo em que se constituía em expressão do seu atraso, ou seja, no lugar da barbárie, Taunay exprimiu toda a sua grandeza literária. Grandeza que residia no seu exato sentimento de paisagem, a partir do qual esta deixou de ser espetáculo para se integrar na sua mais vívida experiência de homem, resultando daí um brasileirismo misto de entusiasmo plástico e consciência dos problemas econômicos e sociais.22 Explicitamente, paisagem em que a guerra e as misérias humanas se confundem e se combinam com o lado obscuro da natureza e com a natureza básica dos homens, primitivos, selvagens, guerreiros.
Munido desse sentimento de paisagem, em A Retirada da Laguna Taunay elaborou a narrativa de um mundo arruinado, tendo como tema principal uma derrota militar em terras exuberantes, nas quais viviam homens paupérrimos. Porém, em meio à catástrofe anuncia-se um devir, pois a obra é também um convite à construção da nacionalidade, constantemente ameaçada pela barbárie escondida entre a natureza imponente, pronta para atacar a civilização que demorava a se estender por aquele pedaço esquecido do Brasil.
Exatamente por isso, A Retirada da Laguna reveste-se de duplo sentido. É, ao mesmo tempo, uma elegia ao orgulho e ao heroísmo patriótico, e um alerta à civilização, que perdeu uma batalha, mas não a guerra. Por serem mais primitivos e próximos à natureza, a ponto de se confundirem com ela, nada mais compreensível que os paraguaios (guaranis) obtivessem a vitória num primeiro momento.23 No entanto, se a civilização, como certamente acreditava Taunay, definia-se pelo conhecimento e o domínio científico da natureza, do mesmo modo como decifrávamos aquela esfinge geográfica, primeiro passo para a conquista do território à nacionalidade, também estávamos inexoravelmente fadados à vitória final.
Assim, o problema parece residir no fato de que, entendida apenas como resto (ou ruína) de um mundo que já foi e não como indício de possibilidades em aberto, concretização de um mundo possível, índice de alternativas ao real; descarnada, portanto, de sua feição literária tanto pela memória coletiva, quanto pela história (a memória coletiva em sua forma científica), A Retirada da Laguna acaba por se reduzir àquilo que ela efetivamente não é. De um lado, reduz-se a mero documento para a reconstituição do passado, cuja objetividade parece opor-se à intencionalidade do monumento. Por outro lado, e simultaneamente, reduz-se à categoria de monumento que, associado à manipulação e à instrumentalização da lembrança, evoca intencionalmente o passado, para reviver coletivamente (comemorar) a memória de acontecimentos (gloriosos ou humilhantes) considerados atos fundadores da identidade nacional, regional ou local, com a sacralização dos grandes valores da comunidade constituindo-se no objetivo principal.
Para Mato Grosso do Sul, unidade da federação criada em 1977 a partir do desmembramento territorial de Mato Grosso, a “Guerra do Paraguai” e, em especial, os episódios relacionados com a Retirada da Laguna transformam-se em elementos essenciais para o processo de elaboração, por parte da memória coletiva local, de representações míticas do passado, capazes de legitimar a própria existência do novo estado, bem como para a constituição de uma identidade local, a partir da qual os sul-mato-grossenses são identificados, entre outros, com o bandeirante “desbravador” do sertão, com o defensor da fronteira e da integridade nacional ameaçada. Representações de um passado mítico e, portanto, excludente de outras possibilidades, que se materializam em versos do próprio hino de Mato Grosso do Sul, escrito por José Antonio Siufi e Otávio Gonçalves Gomes, sancionado pelo Decreto número 3, de 1 de janeiro de 1979:
(...)
Moldurados pelas serras,
Campos grandes: Vacaria,
Rememoram desbravadores
Heróis, tanta galhardia!
Vespasiano, Camisão
E o tenente Antonio João
Guaicurus, Ricardo Franco,
Glória e tradição!
(...)
Transformada, pela memória local, em legado/ patrimônio cultural de Mato Grosso do Sul, a Retirada da Laguna, seu cenário e outros objetos que a ela possam estar vinculados, tornam-se, como destacado no início deste artigo, passíveis de musealização, com vistas ao turismo cultural.
Partindo da premissa de que o legado/ patrimônio cultural, em qualquer sociedade, é sempre produto de uma escolha e, como toda escolha, tem um caráter arbitrário, uma vez que resulta da seleção de alguns elementos enquanto outros são passíveis de esquecimento; considerando ainda a proposição de que o legado/ patrimônio cultural só pode ser entendido como um conjunto de símbolos e, enquanto tal, passível de interpretação para que seja possível a apreensão de seu significado24; e, finalmente, tendo em vista que não se pode negar a influência da atividade turística na construção desse processo de interpretação; resta discutir aqui a seguinte questão: o que torna sustentável a atividade de interpretação histórica e cultural, tendo como objetivo a informação turística?
Para responder a essa questão é necessário considerar a interface entre o método de interpretação histórica e a aquisição de um saber histórico por parte de quem busca o objeto cultural novo. Noutros termos, é preciso tentar conciliar a perspectiva crítica de um pesquisador de história com relação aos documentos sobre um passado que ele busca interpretar e a necessidade de comunicação de sua interpretação, de forma a satisfazer a curiosidade do turista sobre esse mesmo passado.25
Nesse sentido, para ser sustentável do ponto de vista da atividade turística, o processo de interpretação de um objeto histórico e cultural deveria levar em consideração alguns princípios norteadores, tais como: a problematização do objeto para apresentá-lo de forma crítica e estimuladora da curiosidade do visitante; a apresentação do objeto sob uma perspectiva ampliada, considerando seu contexto social, permitindo ao turista selecionar o que sua sensibilidade valoriza na representação; a informação, voltada não para a instrução de alguém que não sabe sobre o tema, mas para a provocação de sentidos do visitante, tendo como premissa que ele se interessou em conhecer o objeto e, portanto, deve ser estimulado a interpretá-lo; a abordagem do tema de forma abrangente, evidenciando seus componentes históricos, sociais, econômicos, ambientais, ideológicos, plásticos, técnicos, etc., de forma a possibilitar uma compreensão que satisfaça a busca de conhecimento do visitante; a revelação dos significados e dos sentidos, de modo a evidenciar possibilidades de interpretação, mesmo que o visitante opte por ressaltar uma única interpretação; a utilização de linguagem acessível, imagens e áudios que possam facilitar a apresentação e estimular a busca; a tentativa de ligar o objeto ao cotidiano presente, de forma que o visitante veja utilidade na compreensão do objeto; a tentativa de sensibilizar o expectador para a preservação do objeto, estimulando nele uma ação preservadora que ultrapasse sua visita. Além disso, deve-se informar de forma breve, considerando que o visitante quer e precisa de autonomia interpretativa e que estará vivenciando o objeto no local de sua visita, sem, contudo, perder de vista que, além de dar sentido e significado ao objeto, a informação deve provocar emocionalmente o visitante para que, estimulado, ele tenha prazer no exercício problematizador. Por fim, no caso de objeto com significados diversificados e contraditórios, apresentar opções mais condizentes e, se for interesse, contradizer significados equivocados ou apresentá-los como criação mitológica, o que tem sentidos interessantes para a interpretação histórica e cultural.26
Quanto ao último item, vale destacar que a memória histórica construída sobre a “Guerra do Paraguai” e a Retirada da Laguna é capaz de produzir um colorido de múltiplos matizes em fatos e documentos, que os historiadores iluminam em suas leituras e que, por sua vez, os literatos acabam por valorizar nas narrativas ficcionais. Leituras interpretativas de uns e imaginações de outros são construídas não necessariamente em termos de oposições, mas para suprir lacunas documentais sobre esse e outros eventos históricos. Noutros termos, fato e ficção, memória histórica e mitos populares, ou seja, interpretações de ordem artística, histórica ou mesmo mitológica, muitas das quais em constante diálogo, podem se juntar para dar substância ao evento, estimulando curiosidades e atraindo visitantes.
De outra parte, é preciso ter claro alguns aspectos sociais que o processo de interpretação do legado/ patrimônio cultural precisa enfrentar, os quais, quando mal avaliados, podem colocar em risco os resultados. O primeiro deles diz respeito à necessidade da democratização do legado/ patrimônio cultural, ou seja, à ampliação, enquanto direito do cidadão de todas as camadas sociais, das possibilidades de acesso à informação. Procedimento que requer tanto uma visão democrática sobre a extensão do saber, como a capacidade de expressar saberes a esferas mais amplas da sociedade.
O segundo aspecto relaciona-se à própria demanda do turismo cultural, que deve considerar o legado/ patrimônio cultural como atrativo, tornando-o atraente para o turista, ao mesmo tempo em que precisa ajudar a preservá-lo e a ampliar as possibilidades de sua apreensão.
A esse, associa-se um terceiro aspecto social, relativo à busca e ao atendimento de políticas de comercialização do produto turístico, que farão com que a interpretação acate questões estruturais de atendimento ao viajante, as quais se distanciam do campo rotineiro dos pesquisadores.
Disso resulta a necessidade de uma perspectiva de trabalho interdisciplinar, a fim de que historiadores, arqueólogos, sociólogos e museólogos, entre outros pesquisadores, percebam a integração com “turismólogos”, comunicadores e profissionais de marketing como um fator essencial do sucesso e da sustentabilidade de suas ações interpretativas. Exatamente por isso, enquanto atividade acadêmica, o turismo não deve se restringir à formação meramente tecnicista, sob o risco de produzir planejamentos econômicos excludentes.
No tocante às propostas de musealização dos diversos elementos vinculados à “Guerra do Paraguai” e, particularmente, à Retirada da Laguna, é preciso reconhecer que um museu histórico é, essencialmente, o lugar da intermediação institucionalizada entre o indivíduo e os objetos materiais que, quase sempre imperceptíveis no cotidiano devido ao seu caráter banal de mercadoria a ser usada e descartada, acabam por se transformar em documentos de tempos e culturas identitariamente destacadas. Noutros termos, enquanto espaço institucional onde os objetos materiais são resignificados pela sociedade, em geral, e pelo turista, em particular, o museu histórico deve ser entendido como uma instituição cujo objetivo não se circunscreve à mera exposição de objetos considerados históricos, mas, sobretudo, à problematização da história.
Se a memória pode ser definida como uma construção social em uma operação ideológica que estrutura imagens e que organiza simbolicamente as relações sociais e seus produtos materiais, produzindo, nesse processo, legitimações, então o museu histórico deve e pode ser um instrumento para isso. Entretanto, quando se tem claro que a história não é apenas memória, mas sim a problematização desta, a interpretação das transformações culturais de uma sociedade, então o museu que se pretende histórico não pode ser exclusivamente evocativo e celebrativo de uma memória, pois a interpretação e a criação de memórias, nas sociedades democráticas, é um direito reconhecido do cidadão, devendo ser a instituição museológica uma ferramenta capaz de estimular esse exercício. Nesse sentido:
Mesmo que se pretenda comemorar ou exaltar algo, é pertinente dar tratamento mais ampliado para o entendimento do objeto em foco. Tratar o patrimônio cultural construído no passado como uma relíquia pode colocar por terra a possibilidade de o visitante evidenciar valor do uso dos objetos, da construção cultural de uma sociedade ou da identificação radical que sustenta a vida dos homens de uma determinada coletividade em outro espaço histórico.27
Algo semelhante pode ser dito a respeito das trilhas destinadas ao turismo histórico e cultural, a exemplo do que se pretende realizar, em Mato Grosso do Sul, com o que vem sendo denominado de trilha da Retirada da Laguna.
Nesses novos caminhos construídos sobre antigas trilhas, ao longo das quais, além do patrimônio natural de rara beleza, as marcas de uma cultura diversa e preenchida de especificidades podem se configurar num conjunto patrimonial de enorme valor para a exploração do turismo sustentável, a História e o Turismo precisam estar unidos para organizar todo um sistema de significados para coisas que devem legar prazer aos visitantes. Nessa rede simbólica, a atividade turística é capaz de estabelecer relações entre a vida material do passado, a paisagem e os costumes e a realidade de quem busca diversão, conhecimento e fuga do cotidiano.
Em suma, como “espaço turístico” a trilha deve ser construída culturalmente, recebendo novos significados, ao mesmo tempo em que deve ter preservada a sua memória, de modo que o viajante ganhe apreço pelo ambiente natural, pela vida material e pelos costumes das coletividades locais. Na expressão de José Newton Coelho Meneses:
Reconhecer um espaço como “turístico” é elaborar uma construção cultural. É dar sentido e significado a coisas e a costumes de tempos diversos e pessoas diferentes do turista. Esse processo dá forma a uma narrativa que orienta a busca de cada viajante e que antecipa os prazeres que podem ser buscados e alcançados. Nessa narrativa, visualizam-se alguns pontos, aspectos ou lugares e lançam-se à sombra outros que não se quer ressaltar ou que não foram entendidos pelo narrador.28
Infere-se daí as aproximações e as similitudes entre o trabalho do turismólogo e o do historiador que, lendo várias ordens de documentos do passado, cria significados e ilumina indícios, ao mesmo tempo em que conserva tantos outros no escuro à espera da descoberta e de novos enfoques. Tais aproximações deveriam ir além do campo metodológico, para se tornarem mais reais na prática do planejamento turístico.
Portanto, se o método de interpretação utilizado pelos historiadores é capaz de problematizar a memória coletiva, colocando em xeque a lógica de seu discurso homogeneizador, isso não exclui a possibilidade dele também contribuir para o planejamento do turismo cultural sustentável, uma vez que possui afinidades suficientes para integrar o trabalho de produção de atrativos culturais para o turismo.
Na prática, o que se nota é que o crescente desenvolvimento da atividade turística, inclusive em Mato Grosso do Sul, tem contribuído para propiciar a necessidade de revisões nas formas de comunicação sobre as interpretações históricas de espaços, ao mesmo tempo em que tem exigido mudanças nos instrumentos tradicionais de informação sobre a história, tanto para as comunidades que recebem os visitantes, quanto para o próprio turista em viagens de lazer. Senão, porque estaríamos discutindo aqui os significados da Retirada da Laguna?
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