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Artigo
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NOVEMBRO/2005: Turismo Arqueológico no Estado de São Paulo?
Fabiana Manzato1 e Mirian Rejowski2
 
RESUMO: Este artigo fornece dados de uma pesquisa exploratório-descritiva realizada em nível de mestrado sobre o Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo no Estado de São Paulo. Para tanto, discorre-se sobre a formatação, crescimento e desenvolvimento deste segmento turístico e em seguida, apresenta dois exemplos de Sítios Arqueoturísticos Muito Adequado para a realização desta atividade turística.


ABSTRACT: This article presents informations of an exploratory-descriptive research accomplished in master's degree level on the Archeological Tourism or Archeotourism in the State of São Paulo. For so much, it talks about the formatting, growth and development of this tourist segment and soon afterwards, it presents two examples of Archaeological Sites Very Appropriate for the accomplishment of this tourist activity.



Introdução

O fator econômico do Turismo foi o primeiro a despertar a atenção para esta atividade. Mas atualmente, pensar desta forma é limitar sua real abrangência e os benefícios que ela traz em seus diferentes âmbitos além do econômico: cultural, social e ecológico. Segundo Moesch (2002, p. 37) acreditar que o Turismo influencia apenas o setor econômico de uma sociedade “é desconhecer a essência de um fenômeno que exerce uma pressão crescente sobre a produção da subjetividade social, o ecossistema, o modo estético e a herança cultural das localidades”.

Com ênfase no âmbito cultural, o Turismo “tornou-se o primeiro instrumento da compreensão entre povos” e tem sido “tradicionalmente empregado para re-valorizar culturas e lograr que as mesmas sejam conhecidas pela humanidade” (KRIPPENDORF, 2001, p.82; ACERENZA, 2000, p.123). O Turismo também “representa um tipo de ação pessoal que enriquece os conhecimentos e representa uma reação contrária à cultura massificada” segundo Beni (2001,p.87).

É neste contexto que o Turismo, em especial, o segmento turístico denominado de Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo destaca-se. Ele aparece como um instrumento capaz de proteger, promover e potencializar o Patrimônio Arqueológico, além de possibilitar ao visitante “experiências mais autênticas e genuínas, passando do ter para ser” (BENI, 2003, p.25).

Nesse sentido, elaborou-se este artigo que fornece dados de uma pesquisa em nível de Mestrado realizado desde de janeiro de 2004, junto ao programa de Mestrado em Turismo da Universidade de Caxias do Sul (UCS), no Rio Grande do Sul. Para tanto, discorre-se a seguir sobre a formatação do Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo, o crescimento e desenvolvimento deste segmento turístico e em seguida, apresenta-se dois exemplos de Sítios Arqueoturísticos Muito Adequado para a realização dessa atividade.



Formatação do Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo

O Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo constitui-se a partir da associação entre o Turismo e a Arqueologia3, trata-se de um desdobramento do Turismo Cultural como afirma claramente Beni (2001, p.86). Seus Atrativos Turísticos são os Vestígios Arqueológicos, ou seja, são “todos os indícios da presença ou atividade humana” segundo Prous (1992, p.25) remanescentes em Sítios Arqueológicos 4 Pré-Históricos e/ou Históricos.

Esses sítios Pré-Históricos e/ou Históricos encontram-se em ambiente terrestre ou aquático, sendo que estes sítios submersos são “os mesmos que encontramos em superfície, com as mesmas características, só que – agora – localizados embaixo da água” decorrentes de um processo natural do avanço ou retrocesso das águas oceânicas ou pela intervenção humana através da construção de barragens, represas, entre outros (RAMBELLI, 1998, p.46).

Define-se que o Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo "consiste no processo decorrente do deslocamento e da permanência de visitantes a locais denominados sítios arqueológicos, onde são encontrados os vestígios remanescentes de antigas sociedades, sejam elas pré-históricas e/ou históricas, passíveis de visitação terrestre ou aquática”.

Mas essas duas expressões, Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo, podem soar estranhas para a maioria da população brasileira, em se tratando da existência de Sítios Arqueológicos nacionais disponíveis para visitação turística, porque para ela o Turismo associado à Arqueologia “se significa alguma coisa, é uma prática aventureira que deve ser levada a cabo no Egito ou em qualquer outro lugar, mas não no Brasil, já que nos faltam pirâmides e outras ruínas interessantes” de acordo com Funari (1994, p.24).

No entanto, essa maneira errônea de se pensar o Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo é fruto de questões culturais mal interpretadas ou apegos a mitos5 que mascaram a existência e beleza deste segmento porque “ainda que os Sítios Arqueológicos brasileiros não tenham a característica monumental de outros da Antigüidade Clássica eles possuem testemunhos suficientes para mostrar a riqueza e diversidade cultural das sociedades” (CALI, 2002, p.121).



Crescimento e Desenvolvimento do Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo

O Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo é o segmento turístico que “mais rápido cresce na indústria de viagem”, segundo (O'NEILL, 2004). Essa afirmação pode ser confirmada por meio dos novos roteiros criados nos mais distintos países, não mais limitando essa atividade a locais como Grécia e Egito. E, além de ultrapassar os limites territoriais entre países, o Turismo Arqueológico expandiu-se sob as águas, através do Turismo Arqueológico Subaquático.

O uso turístico do Patrimônio Arqueológico Terrestre ou Subaquático tem crescido e se desenvolvido em função dos inúmeros benefícios que gera, tais como: “enriquece a visão de mundo; permite resgatar e potencializar as capacidades adaptativas de cada sociedade” além de “melhorar a qualidade de vida; facilita a identidade das pessoas com seu passado e com um projeto futuro compartilhado além de possuir valor econômico” (GONZÁLEZ e GONZÁLEZ, 2000).

A viabilidade turística de Sítios Arqueológicos comprova-se ainda através da grande parcela de visitantes que freqüentam esse atrativo, como se observa, nas ruínas de Xunantunich, em Belize, onde segundo Medina (2003, p.92) “durante o ano de 1999, 27.614 turistas visitaram Xunantunich dado que esta é uma excursão de um dia”. Ou ainda, no Parque Nacional Fathom Five, Canadá onde cerca de 10.000 mergulhadores por ano têm à sua disposição mais de 25 embarcações naufragadas.

Outro beneficio gerado pelo Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo está nas “vantagens dos sítios para explicar as etapas mais remotas de nossa história já que nos museus a mensagem educativa dos objetos se vê limitado pela dificuldade para colocá-los em um contexto cultural e físico” enquanto “no sítio contamos com uma realidade objetiva apoiada em seu contexto original, frente ao museu no qual a realidade vem imposta por um espaço artificial” (MORENO et al, 2004).



Sítios Arqueoturísticos no Estado de São Paulo

De acordo com Manzato (2005, p.101) existem “20 Sítios Arqueoturísticos no Estado de São Paulo”. Para se obter esses resultados foram estabelecidos parâmetros avaliativos, frente às condições de uso, a existência de equipamentos e serviços, disponíveis nos Sítios Arqueoturísticos observados durante as visitas “in loco”. Estas visitas permitiram diagnosticar cada sítio como: Muito Adequado, Adequado, Pouco Adequado ou Inadequado para a realização do Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo.

Dos Sítios Arqueoturísticos diagnosticados como Muito Adequado destaca-se neste artigo: o Engenho dos Erasmos, no município de Santos e a Real Fábrica de Ipanema, no município de Iperó.



1. Engenho dos Erasmos

O Engenho São Jorge dos Erasmos, no município de Santos, está a 72 km da capital de São Paulo e distante 12 km do centro de Santos. O Sítio Arqueoturístico é tido como o primeiro engenho de cana-de-açúcar instalado no Brasil, em 1534.

Localizado em uma área de aproximadamente 4.000 m² esse engenho “era composto por unidades administrativas e residenciais, inclusive dependências dos escravos (senzalas) produzindo cana para exportação, além de rapadura e aguardente para consumo interno no século XVIII” segundo Katinsky (2004).

Após sua decadência, o terreno, com as ruínas, foi adquirido em 1943 por Otávio Ribeiro de Araújo, que o loteou e, em 1958, doou à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, a Universidade instalou uma Base Avançada de estudos acadêmicos e promoções de atividades culturais no local, como o Projeto Vou Volto, que contempla a visitação monitorada (altamente qualificada) nas ruínas e sem qualquer custo aos visitantes.

As visitas devem ser agendadas com antecedência tendo duração de meio período, da manhã ou da tarde. Este Sítio Arqueoturístico está disponível para visitação desde agosto de 2004 e algumas adaptações ainda deverão ser feitas, dentre elas, disponibilização de mais sanitários, bebedouros e placas interpretativas.

O acesso ao Engenho dos Erasmos se faz por meio de ônibus circular a cada 15 minutos, saindo da Rodoviária, ou mesmo em condução própria porque existe uma boa sinalização indicativa para se chegar a este Sítio Arqueoturístico.



2. Real Fábrica de Ferro de Ipanema

Considerada a primeira siderúrgica do país inaugurada em 1818. Localiza-se na Floresta Nacional de Ipanema, no município de Iperó, a 128 km da capital de São Paulo. O Sítio Arqueoturístico dista 8 km do centro do município de Iperó.

A fábrica possuía 8 fornos, com 1,5 m de altura, que produziram o ferro utilizado na confecção de arados, pregos, enxadas, foices, inclusive, armas brancas (espadas, sabres e baionetas) utilizadas pelo Exército Brasileiro na Guerra do Paraguai em 1865.

Para a produção destes utensílios estiveram envolvidos mais de 88 escravos além de 15 mineradores trazidos da Suíça, já que a mão-de-obra existente não era especializada. A decadência da fábrica ocorreu em 1895 devido à forte concorrência exercida por indústrias internacionais.

A Real Fábrica de Ipanema chama a atenção pelos traços monumentais de seus vestígios remanescentes, limpeza e conservação do local e áreas de entorno. É um local para ser visitado em um dia inteiro ou mais, com a possibilidade de se alugar casas ou permanecer em alojamento, ambos dentro do parque onde o sítio também se insere.

Este Sítio Arqueoturístico recebe anualmente em média 20.000 visitantes, está em local cercado de área verde e às margens do rio Ipanema onde a pesca é permitida. O Centro de Visitantes é bem estruturado, no parque existem churrasqueiras, um restaurante, bebedouros, sanitários, estacionamentos, sala de exposição com fotos dos Atrativos Arqueoturísticos, um museu com Vestígios Arqueológicos remanescentes desta antiga fábrica e monitoria local (paga à parte).

Existem várias placas indicativas até se chegar ao sítio, mas infelizmente, o acesso a este acontece por meio de transporte particular ou contratação de táxi, porque não há ônibus circular até o local. Para entrar no sítio deve-se pagar uma taxa de R$ 3,00 por pessoa.

Desde o dia 16 de março de 2005, a Real Fábrica de Ipanema está sendo restaurada, com o apoio da Associação Brasileira de Metalurgia e Materiais (ABMM), patrocínio da Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa) e Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais (Usiminas). O projeto de restauro prevê três fases até dezembro de 2010, quando a fábrica comemora o bicentenário de sua criação.



Considerações Finais

O Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo é um dos segmentos turísticos que mais tem se destacado nesta atividade. Seu crescimento e desenvolvimento podem ser percebidos através do grande número de Sítios Arqueoturísticos hoje disponíveis para visitação, não mais estando estes limitados a locais como Grécia ou Egito, além de existir a possibilidade de realizá-lo em ambiente subaquático.

Os Sítios Arqueoturísticos permitem a instrução pública “in loco” possibilitando ao indivíduo observar as etapas de um passado remoto dentro do seu contexto original e ao mesmo tempo, essa atividade turística dinamiza esses espaços anteriormente restritos aos arqueólogos e pesquisadores afins.

Apesar do Turismo Arqueológico ou Arqueoturismo não se apresentar consolidado como uma atividade turística no Estado de São Paulo, observa-se que o Engenho dos Erasmos e a Real Fábrica de Ferro de Ipanema são exemplos bem sucedidos dentro deste panorama turístico e que certamente contribuem para alavancar o crescimento e desenvolvimento desta atividade tanto para a disponibilização de novos sítios, quanto para a adequação daqueles já existentes, não apenas neste Estado, mas também em território nacional.
 
1 Mestre em Turismo pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e licenciada em História pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

2 Professora do Mestrado em Turismo da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Bacharel em Turismo e Livre Docente em Turismo e Lazer pela Universidade de São Paulo (USP).

3 Arqueologia estuda os sistemas sócio-culturais, sua estrutura funcionamento e transformações no decorrer do tempo, a partir da totalidade material transformada e consumida pela sociedade (FUNARI, 1988, p.9).

4 Sítios Arqueológicos são os locais em que se encontram os vestígios de culturas desaparecidas (KNEIP e PALLESTRINI, 1991, p.14).

5 Para mais detalhes consultar MANZATO, F.; REJOWSKI, M. (Des)Motivações do Turismo Arqueológico no Brasil. Seminário de Pesquisa em Turismo do Mercosul. v.2, n.1, dez. 2004.
 
 
ACERENZA, M. Administración del turismo: conceptualización y organización. 4 ed. México: Trilhas, 2000.

BENI, M. C. Análise Estrutural do Turismo. São Paulo: Editora SENAC, 2001.

BENI, M. C. Globalização do turismo – megatendências do setor e a realidade brasileira. São Paulo: Aleph, 2003.

CALI, P. “História da Cultura brasileira e fontes arqueológicas”. Fronteiras: Revista de História. Campo Grande, Mato Grosso: Editora UFMS, v.6, n.11, jan/jun 2002.



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MANZATO, F. Turismo Arqueológico: Diagnóstico em Sítios Pré-Históricos e Históricos no Estado de São Paulo. Dissertação (Mestrado em Turismo). Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2005.

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MOESCH, M.M. A produção do saber turístico. São Paulo: Contexto, 2002.

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RAMBELLI, G. A Arqueologia subaquática e sua aplicação a arqueologia brasileira: o exemplo do baixo vale do Ribeira de Iguape. Dissertação (Mestrado em Arqueologia). Universidade de São Paulo. São Paulo, 1998.