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NOVEMBRO/2005: Camarqueologia em Angra dos Reis, Rio de Janeiro/RJ
Nanci Vieira de Oliveira1 e Pedro Paulo A Funari2
 
RESUMO: A Companhia de Energia Nuclear Eletronuclear tem financiado a pesquisa arqueológica em sua propriedade, em Piraquara, no estado do Rio de Janeiro (Brasil). As explorações arqueológicas estão sendo realizadas pela equipe liderada pela Professora Nanci Vieira Oliveira, diretora do Laboratório de Biologia Antropológica, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) em associação com o Núcleo de Estudos Estratégicos (NEE), da UNICAMP. As escavações foram realizadas em dois períodos: em janeiro e julho de 2004. Os estudos dos documentos disponíveis e as pesquisas em campo estão ocorrendo ao mesmo tempo. Os documentos do século XVII mencionam a fortificação nessa área costeira e posteriormente, no do século XIX mencionam três importantes fortes de Angra dos Reis: Piraquara, Ponte do Leste (atual Forte do Leme) e Tucupê. Fotografias aéreas também estão sendo estudadas, com destaque para a área da construção da Usina de Energia Nuclear, datada da década de 1960. Luiz Vaia Monteiro, no início do século XVII relata postos de observação contra ataques constantes de piratas em Angra dos Reis e Parati. Esses documentos sugerem que pequenas fortificações situavam-se nessa área, assim como, várias vilas e aldeamentos foram mencionados, como as de São Francisco Xavier, Santuário Mariano, Aldeia dos Índios da Marambaia. Há referências repetidas com relação aos “gentios” (indígenas), roças de índios e a expansão do uso da força de trabalho indígena na área, especialmente pelos Guaianás. Franceses são mencionados, incluindo um consulado francês, sem maiores detalhes, em Manducaba, na mesma área. No espaço pesquisado foi encontrado no primeiro período (janeiro 2004) sítios pré-históricos e históricos e no segundo período (julho de 2004), novas evidências destacam uma ocupação histórica multicultural-étnica da área. Uma série de pequenas fortificações estão sendo identificadas, conferindo com as recomendações estratégicas portuguesas de que pequenos postos de defesa e observação devem incluir uma associação de elevadas e rebaixadas posições, como as mencionadas por Serrão Pimenta em a “Arte de Fortificar” da década de 1660e, chamadas de praças baixas e praças altas. Em Piraquara, várias pequenas construções tem sido identificadas pelos seus postos elevados, que tinham como objetivo visualizar o movimento de embarcações entrando na baía. A área é conhecida pelo Centro de Arqueologia Subaquática (CEANS/NEE/UNICAMP) devido aos muitos naufrágios e seu diretor, Professor Dourtor Gilson Rambelli, participa da pesquisa com o especial objetivo de identificar as embarcações que transportavam escravos para futuras escavações subaquáticas. A área é considerada um espaço público arqueológico e durante as pesquisas de campo, alunos, professores e o público em geral recebe atenção especial. O professor Oliveira coordena um programa interativo, incluindo não apenas palestras, mas também discussões com a comunidade ao redor para a futura utilização dos sítios arqueológicos, com o objetivo de aproximar a população de seu patrimônio arqueológico. Baseado na ênfase da Unesco com relação à diversidade cultural, as atividades arqueológicas voltam-se para a multiplicidade étnica, característica da ocupação histórica da área, onde Indígenas, Portugueses, Africanos e outros grupos misturaram-se durante séculos.

ABSTRACT: The Nuclear Power Company Eletronuclear, has been funding archaeological research in the area under its direct concern, at Piraquara, Rio de Janeiro State, Brazil. The archaeological work has been carried out by a team lead by Professor Nanci Vieira Oliveira, director of the Laboratory for Biological Anthropology, Rio de Janeiro State University (UERJ), in association with the Center for Strategic Studies, Campinas State University, in a joint project. The study of documentary evidence is going on at the same times as the fieldwork. Eighteenth century documents refer to the fortification of this coastal area and later nineteenth century documents refer to three main forts at Angra dos Reis: Piraquara, Ponte do Leste (nowadays Forte do Leme), and Tucupê. Aerial photographs have also been studied, particularly those prior to the building of the Nuclear Power Station, dated up to the 1960s. Luiz Vaia Monteiro in the early eighteenth century reports military outposts against constant Pirate attacks at Angra dos Reis and Parati. These documents suggest that in the small fortifications native Amerindians were stationed and several Indian townships or aldeamentos are mentioned, such as São Francisco Xavier, Santuário Mariano, Aldeia dos Índios da Marambaia. There are repeated references to gentios (Indians), roças de índios (fields cultivated by Indians) and to the widespread use of Indian labor force in the area, especially the Guaianá Indians. French are mentioned, including an obscure French consulate at Manducaba, in the same area. The fieldwork has found in the first season several prehistoric and historic sites and the second season going on as this report is written has been producing new archaeological evidence on the multiethnic historical settlement in the area. A series of small fortifications have been identified, well in tune with the recommendations by Portuguese strategists that small defensive and observation positions should comprise a mix of elevated and lower area positions, what Serrão Pimenta, in his Arte de Fortificar (How to build fortifications) in the 1660s, called praças baixas e praças altas. At Piraquara, several small buildings have been identified in both elevated positions, in order to control visually the movement of boats and ships entering the bay, and at sea level. The whole area is known to have several shipwrecks and the Center for Underwater Archaeology (CEANS/NEE/UNICAMP) under his director, Doctor Gilson Rambelli, is taking part of the fieldwork, and aims especially at identifying slave shipwrecks for a future underwater excavation. The whole archaeological fieldwork is considered in a public archaeology approach, and during the field season pupils, teachers and the general public receive special attention. Professor Oliveira leads an interactive program, comprising not only lectures, but also the discussion with the overall community on the future use of the archaeological sites, in order to foster the appropriation by ordinary people of their own archaeological heritage. In tune with UNESCO’s emphasis on cultural diversity, the archaeological action is keen to stress the multiethnic character of historical settlement in the area, where Indians, Portuguese, Africans, and other peoples intermingled for centuries.



Introdução

A baía de Ilha Grande caracteriza-se por um litoral amplamente recortado e escarpado, com diversas pequenas baías, enseadas, planícies costeiras que são seccionadas pelos paredões do Maciço cristalino da Serra do Mar. Tais características propiciaram a dispersão de populações humanas pelas enseadas e ilhas. Vários sítios arqueológicos nesta região apresentaram alternância de camadas estratigráficas, com maior ou menor consumo de moluscos e peixes, tanto em ocupações pré-ceramistas como em ceramistas, correspondendo a períodos de maior ou menor densidade demográfica (Mendonça de Souza, 1977, 1981; Lotufo, 1995; Lima, 1991, 1995; Tenório, 1992, 1995).

Os sítios ceramistas com uma cerâmica simples, poucos artefatos líticos em lascas e seixos, artefatos em osso (pontas, pingentes, dentes perfurados), presença de moluscos e ossos de peixes, através de projeção etnográfica, são associados aos Guaianá ou Guarumimins, grupo descrito nos séculos XVI e XVII nesta área. Cabe lembrar que no século XVI, várias são as descrições de aldeias e acampamentos dos Tamoios no sul fluminense, sendo a região denominada de Iperoig.

Após a conquista portuguesa, os mesmos aspectos geomorfológicos que propiciaram assentamentos estabelecidos estrategicamente em locais com maior riqueza e diversidade de alimentos, protegidos pelos ventos e com boa visibilidade, passam a ser explorados por corsários que buscavam ancoradouros ocultos aos olhos dos portugueses.

Apesar dos esforços de ocupação por parte das autoridades coloniais, no século XVII, as ocupações coloniais na região ainda mantinham-se de forma tímida, vulnerável às ações de piratas. No entanto, a administração colonial da cidade do Rio de Janeiro não alcançava a maior parte das terras do litoral sul fluminense, já que estas estavam subordinadas a Santo Amaro (SP).

A descida de carregamentos de ouro das Minas Gerais até Parati, de onde eram transportados por via marítima até Guaratiba3 , seguindo para a cidade do Rio de Janeiro, intensificou o interesse estrangeiro pela baía de Ilha Grande. A presença constante de navios franceses nas águas sul fluminense torna-se responsável pela intensa entrada ilegal de escravos africanos para a região das minas e pelo “descaminho” do ouro. A defesa deste litoral para impedir as ações de piratas e o comércio destes com os moradores locais, ocorre por meio de fortificações, guardas e pontos de observação (Mello,1987).

Na área de Piraquara, uma pequena enseada na entrada da baía da Ribeira, em Angra dos Reis, observam-se sítios arqueológicos pré-coloniais e coloniais. Os estudos de tais sítios foram realizados através de financiamento da ELETRONUCLEAR, com o objetivo de salvamento dos mesmos, já altamente impactados, e de tornar a área um espaço de Educação Patrimonial.

As intervenções arqueológicas tiveram por objetivo a avaliação dos sítios, selecionando-se os locais mais significativos para realização de prospecções, transcepts e escavação sistemática, bem como fornecer subsídios para a preservação destes vestígios, para que não sejam afetados por obras ou outras ações antrópicas.

A execução técnica dos trabalhos de campo e laboratório foi coordenada pela Profa. Dra. Nanci Vieira de Oliveira (UERJ), com assessoria do Prof. Dr. Pedro Paulo Abreu Funari (UNICAMP), colaboração do Prof. Dr. Gilson Rambelli4 (Arqueologia Subaquática - UNICAMP ), Ivan Francisco da Silva (Geógrafo - Geoprocessamento - LAB/UERJ), Flávia Vieira de Oliveira Aguiar (Bióloga - LAB/UERJ), Fábio Origuela de Lira (técnico de campo – LAB/UERJ), Guilherme Vieira de Souza (técnico - LAB/UERJ), Paula Leitão (História - bolsista do LAB/UERJ), Letícia Braguez (Geologia - bolsista do LAB-UERJ) e Luiz Fabiano Tavares (História - bolsista do LAB/UERJ). O projeto ainda propiciou a graduandos e mestrandos de outras Instituições participação nos trabalhos de campo, tanto nas escavações sistemáticas no Sambaqui do Velho, como no levantamento de superfície e prospecções nas estruturas históricas: Rosseli Santos da Silveira (Biologia - Universidade de Franca), Leilane Lima (Universidade Estadual de Londrina - aluna especial do MAE/USP), Nathalia Monseff Junqueira5 (História - UNICAMP ), Aline Vieira de Carvalho6 (História - UNICAMP ), Maria Fernanda Brunieri Regis (História - UNICAMP), Julio Cesar Valente (Ciências Sociais - IFCH/UERJ). A pesquisa contou com o apoio institucional do Grupo de Pesquisa “Arqueologia Histórica”, sediado no Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Estadual de Campinas, cadastrado no CNPq7. Os resultados parciais da pesquisas foram reportados no Society for Historical Archaeology Newsletter, Fall 2004, 37, 3, pp. 18-19, apresentado ao final na íntegra em língua inglesa.



Sítios Arqueológicos Pré-coloniais
(X - Y )

Sambaqui do Velho
7454134 - 557314

Polidor/Amolador A
7454179 - 557308

Polidor/Amolador B
7454196 -557308

Polidor/Amolador C
7454167 - 557351



Sítios Arqueológicos Coloniais
1. Muro de arrimo na praia Secreta
7455.561 557.009

2. Estruturas de pedra do marégrafo
7454.834 557.029

3. Estruturas de pedra do portão
7454248 557252

4. Muro de arrimo junto a Marina
7454.295 557.312

5. Edificação do séc. XVIII ao lado do sambaqui
7454131 557326

6. Muro de pedra do polidor/amolador
7454.165 557.349

7. Estrutura de pedra A na área de concentração de fruta pão
7454.056 554.488

8. Estrutura de pedra B na área de concentração de fruta pão
7454.042 557.489

9. Estrutura de pedra do grande matacão
7454.037 557.524

10.Estrutura de pedra na grande jaqueira
7453.963 557.593

11. Estrutura de pedra com vista para a ilha do Tucum
7453.937 557.518

12. Estrutura circular de pedra
7453.959 557.619

13. Estruturas de pedra seca do bambual
7454.000 557.668

14. Estrutura de edificação próxima ao mar
7454.083 557.480

15. Estrutura de pedra de forno de farinha
7453.856 557.015

16. Área de descarte
7454.073 557.517

17. Estrutura circular de pedra da Ponta Grossa
7454.141 557.909

18. Bateria na ponta da Fortaleza
7457.124 558.513

19. Edificação do séc. XIX em frente à praia
7454167 557344



Aspectos Metodológicos

A estratégia adotada para a localização de vestígios arqueológicos consistiu na realização de levantamento sistemático de superfície (inspeção visual), prospecções e transcepts para observação de subsuperfícies, tendo por objetivo verificar a existência de camadas arqueológicas e identificar a extensão dos sítios arqueológicos.

A partir dos resultados dos levantamentos de superfície e subsuperfície, inseriu-se toda a área com vestígios do sambaqui em um sistema de quadriculamento, utilizando-se quadrículas de 2mx2m definidas por letras e números. As áreas de interesse arqueológico tiveram as quadrículas subdivididas em setores de 1mx1m, definidos pelos pontos cardeais, Norte, Sul, Leste e Oeste. O subquadriculamento correspondeu, inicialmente, aos setores ainda preservados do sambaqui, sendo objeto de escavações sistemáticas as quadrículas A1, A2, B1, B2, C1, C2. Posteriormente, na segunda etapa, foi também objeto de escavação a F17, apesar desta encontrar-se em área altamente impactada.



As escavações arqueológicas foram realizadas para conhecer as estruturas arqueológicas internas, artefatos e restos faunísticos, de forma a obter uma maior quantidade de informações que possibilitem uma melhor interpretação das ocupações humanas na área. O evidenciamento das estruturas arqueológicas foi realizado com documentação e registro acurado das ocorrências naturais e culturais significativas. O material arqueológico coletado na escavação do sambaqui, devido à quantidade e diversidade, foi até o presente momento, analisado parcial e preliminarmente, assim como para o material coletado para datações, aguarda-se ainda o resultado destas.

Amostras de restos alimentares, artefatos ósseos, em dentes, conchas e líticos, bem como os poucos fragmentos de cerâmica e louça coletados nos trabalhos de campo encontram-se em análise no Laboratório de Antropologia Biológica da UERJ. Antes das análises, todo o material foi inventariado através de fichas específicas, conforme a natureza da peça.

Os artefatos de rochas estão sendo analisados observando-se matéria-prima, tamanho, forma, marcas resultantes de sua elaboração e uso. Os artefatos elaborados em ossos, dentes e conchas foram descritos e desenhados, observando-se marcas de sua elaboração e uso. Com relação aos fragmentos cerâmicos, devido a sua rara presença no sambaqui, muito pouca informação pode-se obter além de se tratar de vasilhames pequenos, porém sem possibilidade de identificar a forma destes. Apenas no sitio colonial de descarte alimentar, coletou-se melhores fragmentos, ainda por analisar.

Os restos faunísticos estão sendo analisados a partir de pressupostos da Zooarqueologia, buscando-se compreender não somente a dieta alimentar, mas a relação entre o homem e o ambiente, em uma perspectiva antropológica. Devido à diversidade de vestígios faunísticos e metodologia interdisciplinar, as análises tornam-se complexas e, portanto, encontram-se em andamento. Os procedimentos que estão sendo adotados nas análises dos restos faunísticos são:

1. Limpeza e identificação dos restos de acordos com a classe destes;
2. Levantamento da literatura referente à Arqueologia Regional, com ênfase nos sítios pré-coloniais;
3. Levantamento de publicações de especialistas pertinente aos restos faunísticos identificados.



Aspectos Teóricos

Nos últimos anos, a Arqueologia passou por uma revisão crítica de seus postulados epistemológicos. Desde a década de 1980, uma crescente preocupação com a subjetividade da disciplina e com as implicações sociais e políticas de suas ações levou a uma redefinição mesma de seu objeto. A Arqueologia passou a estudar diretamente, a totalidade material apropriada pelas sociedades humanas, como parte de uma cultura total, material e imaterial, sem limitações de caráter cronológico. Partindo dos elementos materiais apropriados pelo homem, visa à compreensão do funcionamento e transformação das sociedades humanas. Insere-se na sociedade e não pode ser dissociada das relações de poder, pelo que se pode afirmar que é também o estudo do poder (arkhé em grego significa tanto antigo como poder)8 . Estas observações significam que o estudo da cultura material impõe uma abordagem multidisciplinar, em que interajam sejam as teorias sociais, como as disciplinas específicas, como a Biologia. Isto significou, no caso do estudo da Arqueologia de Angra dos Reis, adotar uma série de atitudes prenhes de significação teórica, em consonância com a abordagem contextual9:

• Estudo integrado dos vestígios pré-coloniais e históricos
• Equipe inter e transdisciplinar
• Estudo das fontes materiais, textuais e orais
• Apresentação das interpretações como leituras



Seqüência Operacional

Os trabalhos de campo foram planejados em três etapas:
1. levantamento de superfície e escavações nos sítios localizados na praia do Velho;
2. levantamento de superfície e prospecções nos sítios localizados no morro da Piraquara;
3. elaboração de projeto de preservação e preparação do sambaqui como sítio-museu. Deve-se acrescentar que as intervenções em campo foram acompanhadas por atividades relativas à Educação Patrimonial.


Piraquara de Fora: os sítios pré-colonias

O estudo dos sítios anteriores à chegada dos portugueses costuma ser caracterizado como pré-histórico10 e a costa brasileira, entre os atuais estados do Rio de Janeiro e São Paulo, foi uma área em que os contatos entre indígenas e europeus foram precoces. No caso da região de Angra dos Reis, consideramos pré-coloniais os sítios que não apresentaram vestígios de contato e que estavam em posição geográfica que tornava o isolamento, no período histórico, difícil e improvável.

Piraquara corresponde a uma enseada na entrada da baía da Ribeira, se contrapondo à cidade de Angra dos Reis e à Ilha da Gipóia. Na realidade esta enseada subdivide-se em duas, a menor correspondendo a de Fora e, a maior, referente à de Dentro. Nesta última haviam sido inicialmente construídos o Laboratório de Monitoramento e a Marina da Usina Nuclear. Entretanto, atualmente a área encontra-se alterada, devido a deslizamento de sedimentos ocorrido em 1986, que além de destruir parte da BR 101, acabou soterrando as construções ali instaladas.

Devido a tais fatos, a área da Marina foi transferida para a enseada menor, onde residia o senhor Manoel, apelidado como Velho. Os sítios arqueológicos localizados nesta enseada foram descobertos em 1990/91, com apoio do CNPq, FAPERJ e Furnas Centrais Elétricas. Embora tenham sido registradas ruínas na praia do Velho e algumas estruturas no morro da Piraquara, as pesquisas enfocaram, inicialmente, os conjuntos de Polidores-Amoladores Fixos e a proximidade de um sambaqui altamente impactado (Oliveira &Ayrosa, 1992).

De acordo com informações de biólogos do Laboratório de Monitoramento da Usina Nuclear, o deslizamento, embora tenha soterrado parte da enseada da Piraquara de Dentro, em especial a praia do Guariba, acabou afetando a enseada da Piraquara de Fora, destruindo a edificação do século XIX existente no local. Logo atrás desta edificação foi construída uma residência para o zelador da Marina, onde observamos no barranco situado logo atrás desta, evidências de um sambaqui. Os levantamentos realizados na época já indicaram que o sambaqui teve parte impactada no século XIX e parte durante a construção da casa do zelador. Neste período, onde as análises se concentraram nos polidores, foi providenciada, por um dos diretores de Furnas, uma placa com informações sobre os polidores, fixada próxima aos polidores/amoladores A e B.

A partir de 2000 verificamos que os impactos ampliaram-se na área da praia do Velho: construção de um quiosque utilizando-se as estruturas de edificação do século XIX; construção de banheiros sobre a edificação do século XVIII; desaparecimento da placa indicadora dos polidores; colocação pelo IBGE de marco sobre o polidor/amolador B; aumento de rachadura no bloco de rocha do polidor/amolador A; expansão da casa do zelador em direção ao que restou do sambaqui e deslizamento de sedimento sobre este.

Na primeira etapa de campo, os trabalhos concentraram-se nos polidores/amoladores e no sambaqui, avaliando-se as estratégias a serem adotadas posteriormente na terceira etapa. Assim, a ocorrência de constantes chuvas na região, permitiu verificar o impacto das mesmas sobre as estruturas arqueológicas, no sentido de constatar que sedimento descia sobre a área em escavação, já que esta se encontra junto à encosta. Para isso, a ELETRONUCLEAR construiu uma canaleta de drenagem em local logo acima do sítio, bem como uma pequena barreira de contenção mais próxima da área escavada.

As atividades da segunda etapa de campo consistiram em novas e breves intervenções no sambaqui, ou seja, escavação de uma quadrícula no outro extremo da área demarcada, onde havia grande impacto antrópico. As atividades mais intensas foram realizadas nas estruturas históricas, levantamento de vestígios arqueológicos no morro da Piraquara, sendo selecionados apenas algumas das estruturas para a realização de prospecções. Nesta etapa, a análise de fotos aéreas de 1965, 1971 e 1995 auxiliou na compreensão das modificações ocorridas na paisagem, na localização da casas dos antigos moradores, caminhos, etc.

A terceira etapa, embora ainda não totalmente concluída, iniciou-se com novas intervenções arqueológicas no sambaqui, quando o sepultamento (já descrito em relatório anterior) foi totalmente evidenciado e exumado, devendo ser substituído por cópia em gesso. Mantiveram-se as camadas estratigráficas em degraus para exposição, ou seja, partes da camada I na quadrícula C1, da camada II nas quadrículas A1 e B1, da Camada III nas quadrículas B2 e C2, estando visível a base do sambaqui nas quadrículas A2 e B2. A proposta para preservação foi elaborada, prevendo-se passarelas, cercas, cobertura e placas em madeira, de forma a não destoar do ambiente em seu entorno. Entretanto, a definição exata destas está aguardando o projeto definitivo por parte da Arquitetura. A sinalização das estruturas arqueológicas do sambaqui, polidores-amoladores e estruturas históricas, somente deverá ser instalada nos próximos meses.



Polidores e Amoladores Líticos Fixos

Dois conjuntos polidores-amoladores encontram-se em blocos de rocha no lado direito da praia (A e B), havendo também uma marca de polimento isolada nas proximidades destes, e outro conjunto em afloramento rochoso do lado esquerdo (C), todos em rocha gnáissicas.







Apenas no menor conjunto (A), onde toda a superfície foi utilizada para polimento de artefatos, encontramos diferentes tipos de marcas (triangular, elipsóide, alongada, canoa, ovóide e circular), enquanto nos demais as formas predominantes foram elipsóide/ovóide.





No Polidor/Amolador C pode-se observar marca de preparação, onde o autor escolheu uma falha na rocha, depois abandonando-a. Neste conjunto ocorrem um número superior a 100 marcas de polimento, estando parte destas atualmente cobertas por bambual.



A presença de diferentes formas de marcas parece indicar, provavelmente, a total elaboração dos artefatos no local, ou seja, polimento das faces e afiação dos gumes dos machados. A associação entre os polidores/amoladores e artefatos polidos pode ser observada pela presença de um machado polido sobre a camada húmica do sambaqui do Velho.



Sambaqui do Velho

O Sambaqui, embora esteja altamente impactado, teve uma pequena parte preservada próxima à encosta, podendo-se observar seus vestígios até as proximidades dos conjuntos de Polidores/Amoladores A e B. A grande quantidade de sedimento que desceu da encosta não permitia visualizar pela superfície a extensão do que havia permanecido do sambaqui. Através de sondagens realizadas com trado metálico manual, em espaços de 1 metro entra cada, pode-se verificar a profundidade onde iniciava e a extensão de seus testemunhos. As sondagens, em um total de 26, seguiram em linha noroeste/sudeste, acompanhando o barranco onde os vestígios do sambaqui eram visíveis. A partir de outros pontos onde vestígios arqueológicos encontravam-se evidentes e novas sondagens, totalizando 29, onde ocorria aterro posterior, pode-se avaliar a extensão original do sítio e realizar sua demarcação.

Os trabalhos de escavação iniciaram-se com a retirada da camada de sedimento rolado da encosta que recobria a parte intacta do sambaqui, expondo toda a superfície correspondente da mesma. As escavações concentraram-se neste setor do sambaqui, procurando-se preservar partes das camadas arqueológicas, como testemunhos para futura exposição, dentro de uma proposta de Arqueologia Pública.



As camadas arqueológicas acompanham o relevo, o que foi respeitado durante as escavações. O material retirado foi peneirado próximo ao pequeno riacho existente nas proximidades. As estruturas arqueológicas, artefatos e outras observações foram registrados em uma ficha de campo, desenhados e fotografados. As amostras e artefatos coletados na escavação e peneiragem foram controlados através de numeração em ficha de controle de campo.



As camadas estratigráficas do sambaqui do Velho foram diferenciadas pela natureza dos sedimentos e conteúdo faunístico. Assim, a estratigrafia indicou três camadas arqueológicas cujas atividades de subsistência relacionam-se à coleta de moluscos e pesca, estando presente a caça de mamíferos. Um aspecto interessante a observar é o fato de sua base e paredes laterais constituírem-se de blocos de rocha alterada.





A camada I, constituída de matriz areno-argilosa de coloração marrom, apresenta um maior índice de perturbação por agentes antrópicos. Esta camada inicia-se a 20 cm de profundidade, com espessura média de 20 cm, observando-se concentrações de carapaças de moluscos e algumas fogueiras, lascas esparsas pelo solo, fragmentos ósseos de peixe são freqüentes, em menor quantidade ocorrem fragmentos ósseos de mamíferos. Tais características indicam uma ocupação para atividades de pesca e coleta, com predominância da pesca e, a presença de raros fragmentos de cerâmica do tipo simples, cuja espessura indica vasilhames pequenos.



A partir dos níveis entre 40 e 50 cm, a matriz areno-argilosa varia a coloração do cinza escuro ao preto, saturada de conchas moídas e outras inteiras. Nesta camada II, com espessura média de 40 cm, além da grande quantidade de fauna malacológica, ainda ocorrendo concentrações formando bolsões, ocorre significativa presença de restos de vertebrados, predominando os ossos de peixe, em menor escala mamíferos, aves, crustáceos, equinodermas, registrando-se também tubos de poliquetas. Nesta camada foi evidenciado um sepultamento.









Entre 80 e 90 cm de profundidade a matriz começa a se tornar mais escura, apresentando grande quantidade de carvão esparso e estruturas de combustão sem contornos bem definidos. Esta camada III, com espessura variando de 20 a 40 cm, apresentou maior incidência de restos de vertebrados que as camadas I e II. Os restos faunísticos indicam uma prática mais intensa da pesca e caça de mamíferos marinhos, devendo-se registrar também uma maior diversidade de recursos alimentares.







As sondagens realizadas entre a casa do zelador e o quiosque, indicaram camada de terra preta com fragmentos de conchas abaixo dos aterros de épocas mais recentes. Ao lado do quiosque podem-se observar vestígios materiais relacionados ao sambaqui, indicando a outra extremidade do sítio arqueológico. As escavações no setor F17 permitiram constatar a existência de solos arqueológicos com materiais intrusivos, provavelmente da construção do século XIX, que teve suas estruturas reutilizadas para o quiosque. Utilizando como referência duas fogueiras em posições e níveis distintos, interpretou-se tratar-se de dois solos de ocupação ou atividades. Nesta área do sítio o solo é arenoso. As fogueiras apresentaram-se sem muita profundidade, com restos faunísticos, artefatos e objetos intrusivos como cerâmica colonial, argamassa, objeto de metal. No primeiro solo ocorreram muitas carapaças de moluscos, predominando os gastrópodes.



O segundo solo foi o único setor a apresentas valvas de Perna perna (família Mytilidae) quase inteiras, além das espécies já mencionadas nas demais quadrículas escavadas. Ossos de peixes e de mamíferos também estão presentes próximos à fogueira.





Restos Faunísticos

Em termos faunísticos, com base nas amostras coletadas por níveis e setores, além da grande quantidade de concha moída relacionada ao consumo de moluscos bivalves da família Mytilidae, ocorre um intenso consumo de gastrópodes, destacando-se o Strombus pugilis (Linnaeus, 1758), Astraea olfersii (Philippi,1846) e Thais haemastoma (Linnaeus, 1767). Além destas espécies, até o presente momento foram identificadas as seguintes espécies: Tegula viridula (Gmelin,1791), Lyropecten nodosus (Linnaeus 1758), Anadara brasiliana (Lamarck, 1819), Barbatia cândida (Helbling 1779), Astraea tecta (Philippi, 1846), Crassostrea rhizophorae (Guilding, 1828), Ostrea sp. (Linnaeus, 1758), Arca imbricata (Bruguière, 1789), Lyropecten nodosus (Linnaeus, 1758), Trachycardium muricatum (?) (Linnaeus, 1758), Cymatium sp. (Röding, 1798), Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791), Tivela foresti (Fischer-Piette & Testud, 1967), Polinices lacteus (Guilding, 1833), Cymabium vespaceum (Lamarck, 1822). Deve-se ainda registrar a presença do gastrópode terrestre Megalobulimus ovatus (Muller, 1774).

Ao comparamos os indivíduos identificados nas amostras, o consumo de gastrópodes supera o de bivalves, embora de igual importância tenha sido moluscos da família Mytilidae na dieta dos ocupantes do sítio arqueológico. As análises vêm indicando uma maior diversidade de espécies consumidas nos níveis inferiores da camada II e no contato desta com a camada III. Devemos também registrar que as três espécies de gastrópodes mais freqüentes nas camadas arqueológicas também estão presentes no sítio arqueológico histórico de descarte de restos alimentares, sendo muito consumidos até os dias atuais na região.



Os materiais faunísticos foram identificados preliminarmente de acordo com as classes:
peixes: 39565
mamíferos: 177
aves: 66
répteis: 3
crustáceos: 177



Se considerarmos o total de fragmentos ósseos (39.998) e sua distribuição nos três horizontes estratigráficos, a classe predominante em termos de número de peças é a de peixes, tendo sido estes mais consumidos nas camadas II e III.



Entretanto, ao observarmos a freqüência por níveis estratigráficos artificiais, verificamos que entre 80 e 90 cm ocorre um aumento significativo de peças ósseas de peixes.



Restos ósseos de tubarões e raias foram representativos tanto na camada II como na III, sendo as vértebras dos primeiros preferencialmente utilizados na confecção de adornos.

Este maior consumo de peixes é acompanhado por uma maior diversidade de espécies de moluscos, diminuindo conforme se aproxima da base do sítio.



Esta diversidade também se observa nos demais recursos alimentares identificados na camada III, devendo-se registrar que a identificação das espécies ainda encontra-se em andamento.





Estrutura Funerária

Na quadrícula C1, Setor Leste, camada I, observou-se a presença de sedimento argiloso de cor alaranjado intencionalmente transportado para o local e, abaixo deste, foi identificada uma estrutura funerária. A sepultura inicia-se a 40 cm de profundidade, portanto, entre as camadas I e II, estando próxima a uma estrutura de combustão e alimentar. Trata-se de sepultamento primário, estando o indivíduo sentado com as pernas hiperfletidas, em direção opostas, ou seja, encostadas em paredes opostas da cova (NO-SE). Os limites da cova e a posição do esqueleto indicam uma cova redonda com aproximadamente 70x56 cm.



Os pés encontravam-se cruzados, ou seja, o pé direito junto à diáfise da tíbia esquerda e o pé esquerdo junto à epífise distal da tíbia direita, estando alguns metatarsos e falanges sob a tíbia. A mão direita encontrava-se próxima ao joelho direito e a mão esquerda próxima à articulação fêmur-bacia esquerda. As costelas, vértebras, clavículas e omoplatas em conexão anatômica com os úmeros formavam um bloco único, sob os ossos do crânio e mandíbula, o que indica que o individuo foi enterrado com o tronco ereto, provavelmente encostado à parede da cova (NE). O crânio, em decúbito lateral, apresentava a face voltada para Oeste. O eixo bacia – pés indicou a direção SO-NE, ou seja, o indivíduo foi enterrado de costas para o mar. Sobre os ossos da bacia e próximo ao pé direito havia conjuntos de gastrópodes Strombus pugilis e, próximo aos ossos da perna direita, três lascas de diabásio. A base da cova encontra-se a 78 cm de profundidade.








Artefatos

O material coletado e identificado no sambaqui indicou 154 artefatos líticos, como também ocorreram muitos rejeitos, núcleos e estilhas, 27 seixos com sinais de utilização, apenas 8 pequenos fragmentos de cerâmica, 821 artefatos ósseos, 13 artefatos em concha e 7 em dentes.



Os fragmentos de cerâmica ocorreram apenas na camada I, onde se observa um maior índice de perturbação por agentes antrópicos. Estes apresentaram a superfície lisa com tonalidade variando de alaranjado a cinza escuro, pasta fina, com antiplástico de areia. As espessuras destes fragmentos indicam vasilhames pequenos.





A presença de lascas foi freqüente em todas as camadas arqueológicas, assim como a presença de seixos que não sofreram alterações em sua morfologia, sendo utilizados como ferramentas. Apenas nas duas primeiras camadas (I e II) ocorreram fragmentos de pequenos artefatos polidos, cujas análises encontram-se em andamento.



A matéria-prima utilizada para confecção dos líticos, basicamente foi o quartzo e o diabásio. Os levantamentos de superfície indicam que o diabásio, utilizado para a fabricação de lascas, foi retirado da intrusão observada em afloramento nas imediações da Praia do Velho. Já o quartzo parece ter sido explorado em intrusões próximas a corpos graníticos e em blocos encontrados nos canais de drenagem.



Nos artefatos ósseos identificados predominam os adornos, ocorrendo também pontas simples, pontas duplas, pontas fragmentadas, furadores, agulhas e alguns indeterminados, num total de 821 peças, coletadas em todas as camadas estratigráficas. Entre os adornos foram predominantes as vértebras frisadas, seguidas pelas vértebras perfuradas. Os adornos em dentes foram na maioria de tubarão, embora tenha ocorrido na camada III uma peça de dente de carnívoro. Deve-se registrar a presença de uma peça em osso de animal não identificado, provável adorno, seccionado e com perfuração no centro.









Entre as pontas ósseas, predominaram as do tipo simples, embora um grande número esteja fragmentado. Ocorreu um maior número de pontas ósseas a partir de 40 cm de profundidade, diminuindo conforme se aproximava da base do sítio, ou melhor, foram mais freqüentes nas camadas II e III, sempre dispersas pelo solo.





Foram identificadas conchas, em um total de 13, utilizadas como adorno, raspador e outras com marcas de uso, porém sem definição funcional. Os raspadores foram predominantes em Tivela foresti, como também este tipo de concha foi utilizado para outros fins. Uma concha utilizada claramente como adorno foi a espécie Polinices lacteus, embora em número muito reduzido.







Sítios Históricos

Os estudos arqueológicos das sociedades com escrita merecem especial atenção, nos últimos anos, em particular no que se refere ao caráter discursivo tantos dos vestígios materiais como documentais11 . Como constata Nanci Vieira Oliveira,



"El proceso colonial como fenómeno complejo, presentó formas variadas a lo largo de los siglos – con sus contradicciones, resistencias y confrontaciones- Así resulta fundamental, el análisis no sólo de las transformaciones, sino también de las respuestas dadas por los grupos indígenas y sus estrategias frente a la dominación colonial, a través de la interrelación entre las fuentes arqueológicas e históricas como objetos de estudio inseparables."12




No contexto de Angra dos Reis, área de interesse estratégico para a metrópole portuguesa, primeiro, e depois para o estado nacional, há que se distinguir o discurso oficial e normativo dos documentos escritos e a prática quotidiana que podia muito divergir das normas. A região possuía um evidente valor estratégico, tanto em relação ao mar, como em relação à comunicação com o interior. Durante séculos, por ali passavam os metais das Minas e, depois, o café exportado e os escravos importados para a lavoura latifundiária do vale do Paraíba do Sul. Os propósitos oficiais de controle eram, portanto, claros, mas também inevitáveis os mecanismos das comunidades locais de subtrair-se a esse controle e, até mesmo, de utilizar-se das estruturas materiais de dominação para sua subversão, na forma do contrabando e dos atos ilegais de todo tipo, praticados seja pelas comunidades como pelos poderosos do momento, em uma sociedade patriarcal. É neste contexto que se inserem as construções históricas encontradas.

Vestígios de edificações de períodos distintos na praia do Velho já haviam sido identificados desde 1990, encontrando-se estas nas proximidades e sobre parte do sambaqui. Análise de fotografias aéreas indica que, nas décadas de 1960 e 1970, apenas a edificação do século XIX sobre parte do sambaqui ainda existia, que segundo informações era habitada por um morador local de nome Manoel, apelidado de Velho.

O interesse pela ocupação colonial nas proximidades de Piraquara inicia-se na segunda metade do século XVIII, quando encontramos solicitação de carta de sesmaria na área do rio Mambucaba e a construção de uma capela dedicada a Nossa Senhora do Rosário próximo à foz do mesmo rio. De acordo com a carta de sesmaria do Padre Francisco da Nóbrega, administrador do Aldeamento de Nossa Senhora da Guia (Mangaratiba), este adquiriu terras em Piraquara para construção de uma engenhoca (1797), sendo estas contíguas as de sua fazenda na mesma região. No levantamento documental no Arquivo Paroquial de Angra dos Reis surgiu também a indicação de uma fortificação em Piraquara em fins do século XVII, também mencionada por Honório Lima ([1889] 1974) e Alípio Mendes (1970). A existência de uma fortificação igualmente aparece na toponímia, constatando-se uma das extremidades da enseada da Piraquara como ponta da Fortaleza.

Informação também significativa obtida através das cartas de sesmarias, tanto na Piraquara13 (1797) como ao lado desta, em Itaorna (1804), são as indicações de pontas de arpuar e arpoador, termos indicativos da pesca da baleia na região, provavelmente um empreendimento já estabelecido há alguns anos, provavelmente contemporâneo à fortificação. As armações sempre se estabeleciam em entradas de baías, enseadas de fácil acesso, próximas a fortificações, de forma a ter proteção do vento sul e de ataques piratas. Segundo Ellis (1968) teria existido uma sede de empreendimento baleeiro localizado na ilha da Gipóia, próxima a entrada da baía da Ribeira e, portanto, fronteiriça a Piraquara. Como também encontramos uma outra armação de baleia na primeira década de século XVIII na Marambaia, mantendo-se nesta atividade por todo o século XVIII e, provavelmente, durante alguns anos no século XIX.

A vulnerabilidade desta área do litoral fluminense exigiu constantes esforços das autoridades da cidade do Rio de Janeiro. A intensificação da exploração aurífera nas regiões de São Paulo e de Minas Gerais tornou os caminhos do sul fluminense, ao mesmo tempo, eficientes para o escoamento do ouro legal e ilegal. O interesse e a importância desta região para os franceses podem ser observados em seus mapas estando sempre assinalados a cidade do Rio de Janeiro, Parati, Ilha Grande e Marambaia, com detalhes do relevo, locais para abastecimento e construções existentes na região.

Na primeira metade do século XVIII, várias são as consultas ao Conselho Ultramarino e correspondências do Governador Geral do Brasil relatando perseguições a navios piratas franceses, as necessidades de haver no Rio de Janeiro um navio guarda-costas e meios para evitar que os franceses se hospedem na Ilha Grande.

Entre as medidas tomadas pelo governo do Rio de Janeiro para impedir as ações de piratas encontra-se a construção de fortificações e vigias em vários pontos do litoral fluminense, inclusive na Ilha Grande.

Entre estes se encontra a fortificação da Piraquara, cujo levantamento dos vestígios arqueológicos confrontou-se com a dificuldade de identificação devido à intensa dinâmica dos sedimentos no morro da Piraquara, das modificações na praia do Guariba decorrentes de movimento de sedimento na década de 1980 e ações antrópicas até os dias atuais. Devemos lembrar que fortificação, como um termo genérico, encerra em si diferentes tipos de obras para defesa militar. Já o termo fortaleza, presente na toponímia local indica a existência de baterias instaladas em obras independentes. Cabe esclarecer que baterias tanto podem apresentar-se no interior de um forte ou fortaleza como de forma isolada, armada com algumas peças de canhões e geralmente composta de apenas um muro de pedra ou de terra. Os documentos referentes às estratégias de defesa do litoral referem-se à instalação, além das baterias, de faxinas e vigias. As faxinas correspondem à preparação e revestimento com paus curtos ou ramos dos taludes ou dos parapeitos de baterias, de forma a protegerem a artilharia.

A instalação de estruturas de defesa no litoral tinha por base os pontos favoráveis ao desembarque de invasores eventuais, como é o caso de Piraquara, uma enseada bem protegida e com água potável. Dentre as orientações de Luiz Serrão Pimentel (1665) para construção de fortificações, as mais tenazes eram as que “sem serem revestidas de muralha de pedra e cal” tornavam-se mais seguras e defensáveis, porém nunca deveriam ser estabelecidas sem as “praças baixas” (Barreto, 1958; Tavares, 2000).
Na enseada de Piraquara constatamos a existência de estruturas arqueológicas em pedras sob a forma de muretas, alicerces e outras já desfiguradas pelo tempo, ao nível do mar e em diferentes curvas de nível no morro, em pontos com maior visibilidade do mar.



Ao nível do mar, estas muretas ou alicerces encontram-se localizados em ambos os lados da praia do Velho, permitindo uma boa visão da enseada e ao mesmo tempo, a posição de artilharia impediria ou dificultaria o desembarque. Assim, identificou-se no lado direito da praia um muro de pedras (4), que embora esteja impactado pela construção da Marina, pode-se ainda observar uma extensão de 4,90 metros, tendo 90 centímetros de largura e 1,70 metros de altura, orientado para Nordeste.



No lado esquerdo da praia, nas proximidades do polidor C, observa-se um muro de pedra com setores retilíneo e côncavo (6), com diferentes alturas, em conformidade com o relevo do local. O muro apresenta uma extensão de aproximadamente 19 metros, altura variando de 1,30 metros a 50 centímetros, formando sobre este uma plataforma. A orientação Norte é predominante e Oeste em sua extremidade. Este muro encontra-se alinhado com a edificação do século XVIII, a uma distância de 24 metros. Deste ponto tem-se o controle de qualquer desembarque na praia. A prospecção realizada no setor mais alto e retilíneo indicou uma camada húmica com cerca de 20 cm, solo argiloso onde apareceram alguns pequenos fragmentos de louça branca até a profundidade de 40 cm.



Ainda do lado esquerdo da enseada e no mesmo nível do muro descrito acima, distante deste cerca de 150 metros, identificou-se uma base de pedras, bem como alinhamentos de pedras e muros de arrimo de pedra (14). A limpeza da área e as prospecções permitiram identificar dois níveis de ocupação. Uma base de pedra com 12 metros de comprimento e 5 metros de largura, impactada pelo tempo e por ação antrópica; sobre esta, vestígios de uma construção que pela ausência de fragmentos de tijolos e telhas, teria sido uma casa de taipa coberta por palha, com parte de seu piso em cimento, delimitada por pequenos blocos de pedra alinhados, alguns destes aproveitados da construção mais antiga. Para contenção, distante cerca de 2 metros desta edificação, junto ao mar, há um muro de arrimo de pedra.





O posicionamento de bases de defesa ao nível do mar também pode ser observado nas proximidades da praia do Guariba14 , área mais interna da Piraquara, embora deva ser assinalada que esta se encontra totalmente alterada devido a deslizamento de sedimento na década de 1980. Em uma pequena praia no lado esquerdo podemos observar um muro de pedra (2) bem próximo à praia e ao lado de um canal de drenagem. O muro de arrimo em L, com cerca de 7 metros de frente e 1 metro de altura, formando uma plataforma e, sobre esta, distante cerca de 1,50 metros, um outro muro.



Na outra extremidade da Piraquara, ou seja, na ponta da Fortaleza (18), à beira mar, sobre afloramento rochoso, encontra-se uma plataforma de pedras de base retangular, tendo sua parede voltada para o mar com 1, 55 metros de altura e espessura que varia de 60 a 70 centímetros. Junto a esta, em sua parte posterior observa-se uma área de descarte alimentar com grande quantidade de moluscos, similar aos sambaquis. Deste ponto podem-se visualizar embarcações que passem entre Angra e a ilha da Gipóia, enquanto que na Ponta Grossa, a outra extremidade da Piraquara, visualiza-se a entrada por Parati e as embarcações que contornassem a ilha da Gipóia. Esta edificação encontra-se em propriedade particular.



Na enseada de Piraquara de Fora, em níveis mais elevados encontramos, alternando-se espacialmente com as bases ao nível do mar, outras estruturas de alinhamentos de pedras, sempre próximas a matacões. Do lado direito da praia, a 10 metros do nível do mar, uma estrutura de alinhamento de pedras duplas em L (3), tendo 9,60 metros de comprimento, formando uma plataforma, orientada para Nordeste. Após a limpeza da área, foi realizado um trancept na parte externa e ao longo de seu comprimento, bem como uma quadrícula de 2x2 m foi demarcada em seu interior. O solo argiloso encontrava-se muito compactado, apresentando apenas na parte interna da estrutura restos de carvões esparsos localizados, bem como cultura material entre 15 e 30 cm de profundidade. Próximo a estes foram encontrados fragmentos de ferro, uma argola metálica, um botão e uma moeda do Primeiro Império. Todos estes objetos encontravam-se no setor onde havia carvão esparso.



No lado esquerdo da praia do Velho, a 20 metros do nível do mar, aparecem diversas estruturas com pouca distância entre si. Na primeira delas podem-se observar duas estruturas de pedras, lado a lado, orientadas para o Norte. A menor destas, com 4,60 metros de comprimento, muros de pedras superpostos totalizando 1,20 metros de altura, encontra-se ao lado de um grande bloco de granito (7), A outra estrutura corresponde a uma base retangular com cerca de 7 metros de comprimento e 6 metros de largura (8). Esta apresenta um alinhamento simples de pedra distante 1 metro de um alinhamento duplo com 50 centímetros de altura no seu lado frontal. No seu lado esquerdo alguns blocos de pedra indicam ter existido uma contenção e, no lado direito ainda se observa parte de um alinhamento de pedras com 50 centímetros de altura. As prospecções nestas estruturas evidenciaram, na de maior dimensão, um solo altamente compactado e rico em minério de ferro, apresentando formato que lembra encaixe de alguma peça. Não muito distante destas estruturas, há um outro alinhamento simples de pedras de aproximadamente 3metros, também associado a um grande bloco de granito, formando um pequeno patamar, orientada para o Norte (9).







Um outro alinhamento simples de pedras encontra-se em um grande platô, também associado a um grande matacão (10). De forma diferente das demais, este alinhamento encontra-se orientado para o platô, onde vemos uma grande quantidade de rochas, sem uma visibilidade direta do mar. Esta estrutura apresenta-se com aproximadamente 3m de comprimento, orientado para Sudeste. Não muito distante deste observa-se um círculo de pedra amontoadas, coberto por vegetação, com cerca de 1,50 metros de diâmetro (12).



Seguindo à direita do círculo de pedras citado acima, localizamos outros alinhamentos de pedra entre bambuais (13), reaproveitados para construções recentes, orientados para NE, com cerca de 4 metros de comprimento, de onde se tem a vista de toda a enseada da Piraquara de Fora.



Da mesma forma observamos tais vestígios em nível mais elevado na parte interna da enseada da Piraquara de Dentro. Uma edificação do século XIX, reaproveitada nos últimos anos e abandonada, foi construída sobre um grande patamar circundado por um muro de arrimo de cerca de 25 metros de comprimento, tendo um outro ao lado, cujos blocos de pedra parecem mais antigos dos que foram utilizados na casa (1). Tais muros de pedras encontram-se próximos a grandes matacões e possuem ótima visão de toda a enseada. O local foi visitado por nós, somente um levantamento de superfície pode ser feito, pois a área encontra-se fora dos limites da Eletronuclear e desconhecíamos o proprietário.





As construções ao nível do mar parecem corresponder às baterias de terra formando as denominadas “praças baixas”, complementadas pela ação de baterias em nível imediatamente superior, pois todas permitem uma boa visualização da praia e uma distância para tiro. Já nos níveis mais altos, ou seja, no alto do morro da Piraquara, a linha de visada com um alcance muito maior e a presença de outros tipos de estruturas parecem indicar as chamadas vigias. Assim, em um dos pontos privilegiados com vista para a baía de Ilha Grande, pode-se visualizar qualquer embarcação que entre por Parati. Nesta área encontramos próximo a grandes matacões um alinhamento de pedras duplas, com cerca de 12 metros de comprimento (11). Junto aos matacões, em sentido contrário ao alinhamento, observamos superposição de pequenos blocos, o que sobrou do que deve ter sido uma pequena mureta, fechando em parte o acesso ao interior dos matacões.





No mesmo nível, mas em local de ótima visada do mar, no caso da própria Piraquara até seu outro extremo, onde se localiza a ponta da Fortaleza, encontrou-se um antigo forno de farinha já totalmente alterado pelo tempo (15). Uma outra estrutura de pedras amontoadas em círculo e alinhadas já totalmente degradados pelo tempo e outros agentes pode ser observada entre a ponta da Pitanga e a Ponta Grossa (17), local provavelmente também utilizado como vigia, pois possibilita ótima visibilidade do mar e possibilidade de sinalização para a fortificação na Ponta Leste.





Apenas duas áreas de descarte de restos alimentares foram identificadas e parecem estar relacionadas a algumas das baterias e vigias da fortificação de Piraquara. Como já foi citado anteriormente, junto à bateria de terra da Ponta da Fortaleza observamos uma área com grande quantidade de moluscos, ossos e peixes. Ao nível do mar, na enseada da Piraquara de Fora, observamos no barranco outra área de descarte com restos malacológicos, principalmente Strombus pugilis (Linnaeus, 1758) e Astraea olfersii (Philippi,1846), fragmentos de louça e cerâmica colonial (16), provavelmente relacionados às vigias do morro da Piraquara.



Piraquara como fortificação

As estruturas descritas indicam que no local foram construídas as denominadas faxinas, representadas pelos alinhamentos simples de pedra, baterias de terra e vestígios de ocupação referentes aos vigias. A distribuição destas estruturas por toda a enseada, porém independentes, o que garantia sua melhor defesa é o que se denomina como fortaleza. Embora o levantamento tenha se concentrado mais na enseada da Piraquara de Fora, a concentração de estruturas defensivas demonstra que esta enseada bem abrigada deveria ser procurada por embarcações estrangeiras. Estas baterias de terra e vigias não garantiam a destruição do inimigo casual, tinham por objetivo dificultar o desembarque e causar “embaraços” que permitissem a Vila de Angra dos Reis o tempo necessário para a organização de sua defesa em caso de ataque estrangeiro.

De acordo com a correspondência de Luiz Vahia Monteiro (1726) foram instaladas várias peças de artilharia de pequeno calibre em diversas enseadas e locais propícios ao desembarque de navios estrangeiros. Em Angra dos Reis, Honório Lima (1889) menciona fortificações em Tucupê, Piraquara e Ponta do Leste, assim como parece ter existido baterias e vigias em ilhas adjacentes às cidades de Angra e Parati.

Piraquara encontra-se na entrada da baía da Ribeira, se contrapondo ao forte da Ponta Leste, o que permitia sinalização entre seus ocupantes. Da mesma forma que na Ponta do Leste, os vestígios da fortificação encontram-se em diferentes níveis no morro da Piraquara de Fora, tendo nas paredes de pedra próximas ao mar o início para a subida às baterias e vigias, dispostas em locais que permitiam a visualização das embarcações que chegassem pelo Leste ou Oeste.



No inicio do século XIX as fortificações e vigias instaladas no século anterior encontravam-se abandonadas segundo documentos das Câmaras de Parati e Angra dos Reis. A partir de 1823 novas medidas são tomadas em relação à defesa da baía de Ilha Grande, estabelecendo-se novas baterias de terra, reforçando as já existentes, os quartéis e fortes. Assim foi feito em Piraquara. As baterias de terra em melhores condições de preservação correspondem a esta reestruturação defensiva, atestada pela presença de moeda do Primeiro Reinado em uma delas. A quantidade mínima de cultura material nestas estruturas parece indicar que sua utilização não foi muito longa, em meados do século XIX já não existe mais como fortaleza ativa. Verificamos que os descendentes de famílias tradicionais da região não possuem registro na memória da existência de uma fortificação em Piraquara, tal ausência se deve ao fato de os ancestrais destas famílias terem adquirido, em sua maioria, as terras na região após a desativação da fortificação, ou seja, em meados do século XIX.



Arqueologia Pública

Nos últimos anos, a Arqueologia tem atuado de maneira cada vez mais intensa tendo em vista o público leigo, as comunidades envolvidas pela pesquisa arqueológica. Desde a fundação do World Archaeological Congress (1986), a dimensão pública da disciplina passou a ocupar lugar de destaque. No Brasil, a Arqueologia Pública foi impulsionada pelo fim do regime militar, pela legislação de proteção ambiental e cultural e pelo conseqüente envolvimento dos arqueólogos com as populações15 . Neste contexto, a pesquisa arqueológica foi concebida como parte de um processo de interação com a população local, no sentido estrito dos habitantes, e em termos mais amplos dos visitantes das redondezas e de alhures.

Durante as duas primeiras etapas de campo delinearam-se as linhas de atuação arqueológica no sítio, a fim de preservar, estudar e socializar os vestígios materiais, aproveitando-se as constantes visitas dos freqüentadores da Marina. A implementação do projeto de Arqueologia Pública, por motivos alheios aos interesses arqueológicos, será realizado ainda no primeiro semestre de 2005. Porém, as diretrizes encontram-se já definidas, aguardando a visita em campo da arquiteta e arqueóloga Maria Clara Migliacio para a efetivação das estruturas arquitetônicas definidas pelo projeto.

Por se tratar de uma área no entorno da Usina Nuclear, a proposta apresentada a Eletronuclear, atende às normas específicas para circulação de visitantes, ficando por contra da própria empresa o controle das visitações. O projeto de arquitetura deverá ser implantado no conjunto do setor escavado do sambaqui e edificação do século XVIII.

A área escavada do sambaqui deverá ser cercada por madeira tratada quimicamente, de forma similar ao que foi feito no Sambaqui da Beirada, em Saquarema, tendo em seu entorno uma passarela que permita uma melhor circulação do público, já que o terreno é muito inclinado. Será utilizada na área exposta do sambaqui uma tela sombreadora para proteção da mesma contra galhos e folhas.

A construção do século XVIII ao lado do sambaqui será incluída na preparação da área para visitação. Para tal deverá ser removido o banheiro construído sobre esta, recebendo uma cobertura em telha canal com estrutura em madeira, de forma a estabelecer um ambiente propício para exposição de painéis, palestras e oficinas de trabalho para visitantes.

As trilhas serão sinalizadas com placas em madeira (baixo relevo), indicando a localização e informações das estruturas arqueológicas históricas expostas no conjunto do sambaqui. Os conjuntos de Polidores/Amoladores, deverão receber sinalização, através de placas em madeira tratada, de forma a conscientizar os visitantes para preservação das marcas de polimento.



Considerações Finais

O estudo arqueológico dos sítios na área de atuação da Eletronuclear, ainda em seus inícios, já permite observar a riqueza da cultura material, tanto em termos pré-coloniais como históricos. A importância estratégica da área, durante os últimos séculos e até o presente, explica a multiplicação de vestígios relacionados ao controle militar da área, assim como à variedade de práticas sociais a eles associados. O interesse da população local, já despertado, poderá ser concretizado com um programa de Arqueologia Pública em andamento, com a participação ativa da cidadania. A continuidade das pesquisas e das ações poderá revelar aspectos adicionais da História do Brasil, ainda pouco explorados pelo estudo da cultura material, e aprofundar a participação social na interpretação e uso do passado.



Agradecimentos

Agradecemos a todos os membros da equipe mencionados no texto, sem cuja participação este paper não seria possível. Mencionamos, ainda, o apoio institucional da ELETRONUCLEAR, UERJ, NEE/UNICAMP, CNPq. A responsabilidade pelas idéias restringe-se aos autores.
 
1Diretora do Laboratório de Antropologia Biológica da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, nancivieira@uol.com.br.

2 Coordenador-Associado do Núcleo de Estudos Estratégicos (NEE/UNICAMP) e professor titular do Departamento de História (DH/IFCH/UNICAMP), C. Postal 6110, Campinas 13081-970, ppfunari@uol.com.br.

3 Teodoro Sampaio, O Tupi na Geografia Nacional, São Paulo, Editora Nacional, 1987, p. 239, “guarativa, o sítio das garças”.

4 Atualmente, pós-doutorando pela FAPESP no Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Estadual de Campinas.

5 Atualmente, mestranda em História pela UNESP/Franca.

6 Atualmente, doutoranda em Ambiente e Sociedade, UNICAMP.

7 Cf. www.cnpq.br/lattes, grupo de pesquisa liderado por Pedro Paulo Funari e André Leonardo Chevitarese, no qual atuam também Nanci Veira Oliveira e Gilson Rambelli.

8 Cf. Pedro Paulo A Funari, Arqueologia. São Paulo, Contexto, 2003.

9 Cf. Pedro Paulo Funari, Andrés Zarankin, Emily Stovel (eds), Global Archaeological Theory, Contextual voices and contemporary thoughts, Nova Iorque, Kluwer/Plenum, 2005.

10 Cf. Pedro Paulo A Funari e Francisco Silva Noelli, Pré-História do Brasil. São Paulo, Contexto, 2002.

11 Cf. P.P. A. Funari, M. Hall & S. Jones, Historical Archaeology, Back from the edge, Londres, Routledge, 1999, 350pp, ISBN0-415-11787-9.

12 Nanci Vieira Oliveira, Arqueologia e Historia: estúdio de um poblado jesuítico em Rio de Janeiro, Arqueologia em América del Sur, Los desafios del siglo XXI, Bogotá, Uniandes, 2004, p. 73.

13 Teodoro Sampaio, O Tupi na Geografia Nacional, São Paulo, Editora Nacional, 1987, piracuara, “o pescador”.

14 Teodoro Sampaio, O Tupi na Geografia Nacional, São Paulo, Editora Nacional, 1987, p. 239, guariba, “indivíduo feio, casta de macacos”.

15 Cf. Pedro Paulo A Funari, Public archaeology in Brazil, in Public Archaeology, edited by Nick Merriman, London and New York, Routledge, 2004, 2002-210, ISBN 0 415 25888 x (hbk) 0 415 25889 8 (pbk).
 
 
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TAVARES, Aurélio de Lyra (2000) A Engenharia Militar Portuguesa na construção do Brasil. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército Editora.

Fontes Documentais
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Lisboa, 26 de setembro de 1699. Consulta do Conselho Ultramarino, sobre as instruções que pedira o Governador do Rio de Janeiro a respeito do socorro que devia enviar aos navios, que navegavam de Santos para o Rio, para os proteger dos ataques dos piratas. AHU-Baía, cx. 6, doc. 116. AHU_ACL_CU_005, Cx. 7, D. 590.

Lisboa, 2 de setembro de 1704. Consulta do Conselho Ultramarino, acerca das informações que remetera o Governador e Provedor da Fazenda do Rio de Janeiro, dos roubos praticados por dois navios piratas e das providencias tomadas para os perseguir. AHU-Baía, cx. 6, doc. 116. AHU_ACL_CU_005, Cx. 7, D. 590.

Bahia, 12 de abril de 1712. Carta do governador-geral do Brasil Pedro de Vasconcelos ao rei [D. João V] informando sobre as naus francesas que foram a Ilha Grande. AHU-Baía, cx. 6, doc. 116. AHU_ACL_CU_005, Cx. 7, D. 590.

Lisboa a 13 de janeiro de 1717. Provisão passada a Paullo Luiz da Gama sobre contrato da pescaria das baleias nas Armações da cidade do Rio de Janeiro e da Marambaia. Arquivo Nacional, Fundo Governadores do Rio de Janeiro, cód. 77 . V. 24.

Bahia, 16 de Agosto de 1721 - Carta do vice-rei e governador-geral do Brasil Vasco Fernandes César de Menezes para o governador do Rio de Janeiro Aires de Saldanha de Albuquerque sobre: recebimento de cartas, tranquilidade das minas, com a remessa de um destacamento, a chegada da frota, despesa dos soldados e navio francês que se achava na Ilha Grande. AHU-Baía, cx. 12, doc. 4 e 5; AHU_ACL_CU_005, Cx. 15, D. 1244.

Bahia, 28 de fevereiro de 1724. Carta do vice-rei e capitão-general do Brasil, conde de Sabugosa, Vasco Fernandes César de Menezes ao [governador do Rio de Janeiro] Aires de Saldanha de Albuquerque recomendando que remeta para a Bahia a família do francês João Borguignon e os seus bens que se lhe seqüestraram na Ilha Grande. AHU-Baía, cx. 16, doc. 9. AHU_ACL_CU_005, Cx. 18, D. 1631.

Rio de Janeiro, 7 de novembro de 1726. Carta do Governador Luiz Vahia Monteiro, sobre a fortificação e construção dos quartéis da Ilha Grande. Publicação do Archivo Nacional, volume XV, 1915.

Lisboa, 9 de julho de 1727. Provisão régia pela qual se louvou o Governador Luiz Vahia Monteiro pelas medidas que tinha tomado para defesa das Vilas de Parati e Angra dos Reis. Publicação do Archivo Nacional, volume XV, 1915.

Lisboa, 24 de novembro de 1730. Consulta do Conselho Ultramarino, acerca da informação enviada pelo Ouvidor geral do Rio de Janeiro sobre as obras da Fortificação da Ilha Grande. Publicação do Archivo Nacional, volume XV, 1915.

Documentos da Câmara da Villa de Paraty, com relação aos Fortes, Quartéis e Guarnições Militares, no período de 1823 a 1850, transcritos e organizados por RAMECK, M.J. & MELLO, D. (org.) na obra Roteiro Documental do Acervo Público de Paraty, 1801-1883, Câmara Municipal de Paraty, Instituto Histórico e Artístico de Paraty, 2004.

Informe sobre os resultados parciais da pesquisa, publicado no Society for Historical Archaeology Newsletter, Fall 2004, 37,3, pp. 18-19, por Pedro Paulo A. Funari.